23 Nov 2024
“Bowling Saturno” é um thriller dramático, um conto negro centrado na relação entre dois irmãos. Guillaume, um polícia ambicioso, vai ceder ao meio-irmão, Armand, um jovem delinquente, a gestão da pista de bowling, herança que o pai de ambos deixou quando morreu. Este gesto vai mergulhar os dois homens num abismo de violência.
A cineasta Patricia Mazuy estava interessada em explorar a ideia de um filme negro contemporâneo baseado em relações de dominação, filmar uma tragédia:
É uma tragédia sobre a herança maldita de dois irmãos. Por se tratar de uma tragédia, exploramos a violência. O que a transmitiu? Há um filho mau e um filho bom. E, de facto, há um que fica para trás… É a história de homens que não dão espaço às mulheres.
O filme tem três partes. A primeira parte é sobre Armand. Na segunda parte, vemos o irmão mais velho e como ele lida com o facto de não conseguir chegar a lado nenhum, de ser sempre atraído pelo bowling, como um imã. E a última parte é o caos. Era uma estrutura forte que me permitiria fazer o filme de forma única e honesta.
A questão da origem da violência, de onde vem e como se pode transmitir o desejo de matar, são perguntas a que o filme procura dar respostas. O vórtice do filme é a cena do assassinato. A cineasta aponta também o jantar dos caçadores:
É realmente um filme noir, com um conto fúnebre, digamos. Sobre o que fazemos com a violência, como ela surge, como é ser violento pela primeira vez e depois torná-la uma rotina.
O filme está estruturado em torno de dois momentos de violência. Um momento de violência física e depois um momento de violência insana, o jantar dos caçadores.
É uma cena surrealista, mesmo barroca, em que os amigos do pai, que morreu no início, se reúnem numa pista de bowling para comemorar a morte do seu companheiro caçador, sabendo que era a paixão da sua vida ir matar animais em África, ou nos países coloniais.
A pista de bowling e a casa do pai são dois cenários significativos do filme. O apartamento parece assombrado com desenhos e cenas de caça. Patricia Mazuy compara a pista de bowling instalada na cave ao covil de um ogre, ajudando a criar um ambiente sombrio e violento:
Posso descrevê-lo como um thriller feroz. É por isso que estamos a explorar a velocidade. De onde é que ela vem? Achei muito poderosa a ideia de enterrar a pista de bowling na cave, porque é como uma metáfora do ogre. O ogre que morreu, o pai ogre, vê-se que é um conto negro.
Para mim, é como se este ogre tivesse a cabeça no quinto andar e a pista de bowling no subsolo, que é como se fossem os intestinos por onde todo o mal sai. Depois, com esta metáfora, permitiu-nos trabalhar a cor para que o filme fosse escuro, mas não sombrio. Tinha de haver um gesto estético forte para descrever este bowling na cave, como se fosse o cuvil do mal e que nos fascinasse.
Para criar o ambiente da cidade retratada no filme, Patricia Mazuy filmou em três cidades francesas, Cannes, Deauville e Lisieux:
Fizemos o interior da pista de bowling numa cidade chamada Deauville.
A pista de bowling na cave do apartamento do pai foi feita numa terceira cidade, onde encontramos um túnel subterrâneo. Foi aí onde fizemos uma falsa entrada de estúdio para a pista. Foi um quebra-cabeças incompreensível para fazer os cenários.
Misturamos três cidades para fazer a cidade do filme. Porque este filme, também, tem a ver com a imaginação. Os atores tiveram de estar muito concentrados, porque fizemos primeiro todo o campo. Depois, os interiores de Deauville e Lisieux. O apartamento do pai era no prédio por cima da pista de bowling subterrânea.
“Bowling Saturno” parte de uma história simples de irmãos para se tornar um filme negro e tenebroso. O filme teve antestreia no LEFFEST onde integrou uma retrospetiva do cinema de Patricia Mazuy.
Estreia esta semana nas salas portuguesas.