01 Set 2024
O ator Adrien Brody reapareceu no Festival de Veneza com grande sucesso, num filme monumental que revisita o mito americano da integração e as suas falhas, através do percurso de um arquiteto que sobreviveu ao Holocausto.
Apresentado em competição, “The Brutalist” aborda também, de forma mais alargada, a questão das repercussões ao longo do tempo do trauma da Shoah, tanto a nível psicológico dos sobreviventes e dos que os rodeiam, como através das suas obras e do mundo que moldam.
O ator americano, galardoado com um Óscar há vinte anos pelo papel de um sobrevivente do gueto de Varsóvia em “O Pianista”, de Polanski, retoma o curso da história ocidental mais ou menos no ponto em que parou, no final da Segunda Guerra Mundial.
Em “The Brutalist”, realizado por Brady Corbet, interpreta um arquiteto húngaro (fictício, mas inspirado em várias figuras históricas) do movimento Bauhaus chamado László Toth, que consegue emigrar para os Estados Unidos logo após a guerra.
Começando do nada e sem um tostão, afunda-se na droga e na pobreza, antes de conhecer um milionário dos subúrbios de Filadélfia (interpretado por Guy Pearce), que o alimenta e aloja e lhe encomenda a construção de um imponente edifício, que demora anos a concluir.
À medida que László vê finalmente a possibilidade de conquistar a sua parte do sonho americano e a perspetiva de trazer para junto de si a sua família, ainda retida na Europa, o tecido começa a desfazer-se, rasgado pela xenofobia e pelo antissemitismo latente.
O filme, que utiliza a arquitetura como uma metáfora inteligente das instituições humanas, causou grande agitação quando foi exibido no Lido. É um filme diferente de todos os outros na corrida ao Leão de Ouro, que começou na quarta-feira e termina a 7 de setembro.
História virtual
Rodado em 70 mm, um dos mais belos formatos cinematográficos, “The Brutalist” estende-se ao longo de 3 horas e 35 minutos, com um intervalo de um quarto de hora, e nunca deixa de levar o espetador em direções surpreendentes.
“Este filme faz tudo o que nos dizem que não nos é permitido fazer. Acho uma grande parvoíce falar sobre a duração do filme, porque é como criticar um livro por ter 700 em vez de 100 páginas“, disse o realizador do filme, Brady Corbet, durante a conferência de imprensa.
“Fizemos o nosso melhor para tentar evocar um estilo de filmagem de outrora, não recorrendo a muitas dessas muletas (modernas)”, explicou.
A Bauhaus foi uma escola artística que floresceu no início do século XX, antes de ser proibida pelos nazis que perseguiram os seus autores. “Há tantos arquitetos talentosos da Bauhaus cujo trabalho nunca pudemos ver, o que teriam querido construir, que tipo de futuro imaginaram”, prosseguiu Corbet.
“Infelizmente, este filme é ficção, história virtual, a única forma de visitar este passado”, acrescentou o realizador de 36 anos, mais conhecido pela sua carreira de ator. Fruto de sete anos de trabalho, “o filme é-lhes dedicado, aos artistas que não puderam realizar a sua visão”.
Inspirado por um tema bastante difícil, “a manifestação física dos traumas do século XX” na arquitetura, “The Brutalist” é sustentado por uma lufada de ar fresco e uma atenção às personagens que nunca o faz descarrilar.
O filme é particularmente importante para Adrien Brody, que “sentiu imediatamente compreensão e empatia pela personagem”.
“A minha mãe (Sylvia Plachy) é uma fotógrafa nova-iorquina, mas é também uma imigrante que fugiu da Hungria em 1956 e se refugiou nos Estados Unidos e, tal como László, teve de começar tudo de novo e perseguiu o sonho de ser artista”.
“É uma ficção que parece muito real, é muito importante para mim tornar a personagem real”, continuou. “O filme não representa apenas o passado, mas deve recordar-nos esse passado e o que temos de aprender com ele para o nosso presente.”
Foto: (Giorgio Zucchiatti La Biennale di Venezia – Foto ASAC)