O romance “As Oito Montanhas” de Paolo Cognetti inspirou os cineastas belgas Félix van Groeningen e Charlotte Vandermeersch, que mudaram de vida para conhecerem em pormenor as paisagens descritas no livro que decidiram adaptar ao cinema.
Segundo Charlotte esta era a única forma de honrar as palavras e interiorizar a mensagem do livro: “Levámos a nossa caravana e o nosso filho e fomos até Itália alguns meses antes da rodagem (…) Queríamos conhecer a língua ainda melhor, o que era essencial para o filme. E a autenticidade era muito importante, por isso todas as paisagens que aparecem no filme, nós fomos lá várias vezes (…) Construímos uma casa a 2100 metros de altitude. Fomos ao glaciar. Subimos uma montanha nos Himalaias. Essa foi a nossa viagem juntamente com a nossa fantástica equipa.”
O livro e o filme contam a história de uma amizade profunda entre dois homens, que se estende ao longo de 30 anos. Os dois conhecem-se na adolescência nas férias de Verão e são as únicas crianças da pequena aldeia, junto à Serra. Pietro é o visitante que vem da cidade. Bruno nunca saiu dali.
A vida encarrega-se de os separar durante vários anos, até ao reencontro já adultos, para o projeto de recuperar uma casa em ruínas em plena montanha.
A partir daqui cresce uma ligação única, especial e inabalável.
A amizade no masculino é poucas vezes retratada desta forma, mas Charlotte sublinha que enquanto mulher se sentiu próxima dos personagens e da ligação que os une: "… consigo relacionar-me com eles, pelo respeito que têm um pelo outro. Eles nem sempre conseguem encontrar as palavras certas, mas entendem-se. E não há competição. Eu e o Félix adorámos estas pessoas que tentam encontrar o seu caminho na vida (…) É na realidade uma história épica que aborda temas essenciais da vida, através desta amizade.”
Pietro é um homem solitário que ambiciona ser escritor e viajar para concretizar uma crença do Nepal, segundo a qual, a subida às oito montanhas do mundo situadas no caminho para o centro, pode conduzir a uma descoberta interior. Bruno é um homem em plena comunhão com a natureza mais dura e difícil, que ambiciona fixar-se num único lugar e viver do que a terra lhe proporciona. Os dois representam os extremos dos nossos tempos.
Para Charlotte a história de “As Oito Montanhas” resume o que estamos a viver: “O modo antigo de viver nas montanhas com os animais e ser auto suficiente está a desaparecer, devido à forma como vivemos agora e a todas as novas regras. O mundo está a mudar e isto não é unicamente uma coisa má. Encontramos novas formas de fazer agricultura biológica, mas ainda assim, há valores deste outro tempo que estão a perder-se.”
Tal como o autor do livro que descreve as experiências pessoais nos Alpes italianos e no Nepal, os realizadores passaram meses nos Alpes e viajaram para os Himalaias, para filmarem e viverem de outra forma. Félix adianta que o filme que resulta desta mudança é o que querem alcançar: “O que fizemos neste filme e o que queremos para a nossa vida, juntaram-se. A busca destas personagens é a nossa. As questões que eles colocam são as nossas.
“As Oito Montanhas” é um drama inspirador sobre a amizade entre dois homens, e a relação com o imenso mundo de que fazemos parte. O casal Félix van Groeningen e Charlotte Vandermeersch já tinha trabalhado em conjunto nos projectos anteriores de Félix enquanto realizador, (“Ciclo Interrompido” e “Beautiful Boy”), mas este é o primeiro projeto dirigido a dois, semelhante a uma etapa de vida, um plano de futuro, uma ideia de encarar a nossa passagem pelo mundo de forma diferente.