18 Dez 2019 17:06
Sucesso de bilheteira no Brasil (700 mil espectadores), grande prémio do júri no mais recente festival de Cannes, "Bacurau", do pernambucano Kleber Mendonça Filho, não encontrou distribuidor em Portugal. Chega esta quinta-feira a uma única sala de cinema, o Trindade, no Porto. Antes, o mesmo realizador assinara "Aquarius", que valeu a distinção de Sónia Braga como melhor atriz, também em Cannes, em 2016.
Ao mesmo tempo inspirado nos westerns, no suspense de John Carpenter e de outros cineastas dos anos 70 e 80, "Bacurau" é uma enorme mistura, reflexo do Brasil. Crítica social, chamada de atenção para o retorno de um racismo sem vergonha, dedo apontado aos clichés, ao branco rico e sofisticado do sul versus o pardo pobre e rural que fala engraçado do nordeste, repulsa pela entrega do país a interesses estrangeiros.
Passado numa pequena cidade fictícia no sertão brasileiro onde os habitantes descobrem que deixaram de constar em qualquer mapa, "Bacurau" começa com a morte da matriarca do povoado, Dona Carmelita, de 94 anos. Aos poucos, a população percebe que algo estranho está a acontecer, drones passeiam pelos céus e estrangeiros chegam à cidade. Quando os tiros começam e aparecem os primeiros cadáveres, as gentes de Bacurau descobrem que estão a ser caçados por puro divertimento e decidem organizar a sua defesa.
Kleber é assumidamente um realizador político numa sociedade polarizada, onde governa a extrema direita, reacionária, anti-intelectual e saudosista dos tempos da ditadura militar. Protestou em Cannes contra o golpe palaciano que tirou Dilma Rousseff do poder substituindo-a por Temer, voltou a protestar, agora em Marraquexe, contra a retirada de vários posters de filmes históricos do cinema brasileiro do edifício do Agência National do Cinema (ANCINE), o organismo público que coordena a atribuição de verbas públicas.