19 Nov 2015 18:14
Será que existe uma tradição cinematográfica de abordagem da fotografia? Quando vemos o filme "Life", em que Anton Corbijn evoca a relação do fotógrafo Dennis Stock com James Dean, somos levados a pensar que sim. Em qualquer caso, há filmes que emergem como símbolos incontornáveis — "Blow-up", realizado por Michelangelo Antonioni, em 1966, constitui uma referência incontornável.
Elemento fundamental do filme é a sua música, da autoria do grande Herbie Hancock, visceralmente ligada às sensibilidades transformadoras da década de 60, abrindo a tradição do jazz à "perversão" das novas electrónicas. Antonioni usava as composições de Hancock para sublinhar os modos de vida de uma cidade, Londres, marcada por novos valores libertários e também pelo impasse da sua formulação — de onde vimos, para onde vamos?, eis a questão.
A história de "Blow-up" resume-se em dois ou três pormenores sobejamente conhecidos: um fotógrafo, interpretado por David Hemmings, regista o enlace de um homem e uma mulher num parque; a mulher, Vanessa Redgrave, tenta que ele não utilize as fotografias… O certo é que, ao revelá-las, o fotografo vai descobrir, algures nuns arbustos, qualquer coisa que parece um corpo caído. E quanto mais amplia as imagens (fazendo blow-up, precisamente), mais sente que não sabe o que está a ver…
Como dizia o trailer original de "Blow-up", “por vezes, a realidade é a mais estranha das fantasias”. Estamos perante uma aventura em que, quando as imagens vacilam, vacila toda a realidade que através delas construímos. Depois de títulos emblemáticos como "A Aventura" (1960) ou "Deserto Vermelho" (1964), Antonioni continuava a filmar uma sociedade em que já ninguém parece acreditar na realidade, mas apenas nos seus simulacros — para mal dos nossos pecados, "Blow-up" continua a ser um filme actualíssimo.