14 Set 2017 23:25
Entre os objectos de culto de 2017, está "Paterson", de Jim Jarmusch, um filme de tal modo envolvido com a palavra poética que nos leva a perguntar como é que a poesia pode contaminar o cinema. Ou ainda: como é que uma determinada visão cinematográfica se pode desenvolver a partir de raízes poéticas. Uma excelente resposta está no filme que Todd Haynes dedicou a Bob Dylan — surgiu em 2007, depois de um longo processo de produção, e chama-se "I’m Not There".
Não foi, obviamente, por acaso que Todd Haynes escolheu como referência para o título do seu filme a canção "I’m Not There" — à letra, “Não Estou Aí”. Para além de ser uma canção que ficou longamente arquivada nas gravações menos conhecidas de Dylan (as lendárias “Basement Tapes”), nela reconhecemos essa vontade de não ocupar o lugar com que os outros definem a nossa identidade — Bob Dylan é, afinal, aquele que resiste a ser biografado.
Trata-se de dar a ver/dar a ouvir a música de Dylan através de outras vozes. E mais do que isso: de o retratar como uma figura repartida por muitas personagens. Daí a presença, não de um, mas de seis actores que interpretam Dylan — são eles Christian Bale, Markus Carl Franklin, Richard Gere, Heath Ledger, Ben Whishaw e Cate Blanchett.
"I’m Not There" é um fascinante objecto de cinema que apetece definir como um filme coral — o cruzamento de personagens e canções, da vida vivida e da vida imaginada, devolve-nos um Bob Dylan que não cabe em nenhum cliché, que não se aquieta em nenhuma imagem definitiva. Isto sem esquecer, claro, as magníficas versões que a banda sonora integra, com gente como The Monkees, Stephen Malkmus, Richie Havens, Tom Verlaine — e ainda, em "All Along the Watchtower", o vocalista dos Pearl Jam, Eddie Vedder.