31 Dez 2021 19:03
Quando vemos o filme "Spencer", sobre a Princesa Diana, somos levados a descobrir uma lógica paradoxal: por um lado, o realizador Pablo Larraín vê nela aquilo que todos vemos, uma figura mítica da história da realeza britânica; ao mesmo tempo, mostra-nos por A + B que essa figura é insuficiente, e até equívoca, para compreendermos a complexidade da personagem. Em boa verdade, ele já tinha feito algo de semelhante, em 2016, com as memórias de outra figura mítica: Jacqueline Kennedy — o filme chama-se "Jackie".
Esta é a personagem de Jacqueline Kennedy fazendo saber a um elemento dos serviços secretos que, apesar dos problemas de segurança suscitados pelo funeral do marido (o Presidente John Kennedy), ela insiste em acompanhar o cortejo fúnebre. Na composição da figura de Jackie está Natalie Portman naquela que é, de longe, a melhor performance da sua carreira — uma mulher que vive uma tragédia radical, sabendo que as pessoas, o público em geral gosta de acreditar em contos de fadas.
Pablo Larraín é um cineasta chileno que tem uma parte importante da sua obra ligada à história do Chile, em especial através da notável trilogia sobre a ditadura de Augusto Pinochet — ou seja: os filmes "Tony Manero" (2008), "Post Mortem" (2010), e "Não" (2012). Por todos estes filmes perpassa uma visão que não se esgota nos sinais da história, ou melhor, que trabalha esses sinais através de uma musicalidade de sentidos e significações que, curiosamente, tem sempre um contraponto decisivo nas respectivas bandas sonoras — ouça-se, a esse propósito, a música de "Jackie", composta por Mica Levi.