1 Nov 2019 23:25

O novo e belíssimo filme de Woody Allen, “Um Dia de Chuva em Nova Iorque”, está pontuado por melodias e ritmos mais ou menos jazzísticos, afinal reflectindo a dimensão musical do seu universo — a música não é um elemento banalmente decorativo, antes uma matéria viva que participa das convulsões dramáticas da história que está a ser contada. Se recuarmos exactamente 40 anos, portanto a 1979, encontramos um caso exemplar e inesquecível.


São os sons inconfundíveis de "Rhapsody in Blue", de George Gershwin, uma composição datada de 1924 que reflecte e, mais do que isso, celebra a contaminação da música clássica pelo jazz. É esta peça que serve a Woody Allen para abrir o seu "Manhattan". Vale a pena escutarmos o modo como, logo no começo, a música de Gershwin se cruza com a voz do próprio Woody Allen, confessando a dificuldade de encontrar as palavras certas para começar o capítulo 1 para descrever Nova Iorque.


Fotografado por Gordon Willis em deslumbrantes imagens a preto e branco, "Manhattan" condensa uma obsessão central do universo de Woody Allen. Assim, Nova Iorque não é exactamente o pano de fundo das acções das personagens, antes uma outra personagem — imensa, sedutora, indecifrável — que parece acompanhar (eu diria: vigiar) as atribulações dos frágeis seres humanos. E isso perpassa nos magníficos diálogos escritos por Woody Allen, por exemplo num momento de quase ruptura em que ele próprio contracena com Mariel Hemingway.


O elenco de "Manhattan" é uma luxuosa colecção de talentos em que também encontramos, por exemplo, Diane Keaton, Michael Murphy, Wallace Shawn e Meryl Streep. Por todos eles perpassa o movimento contraditório dos laços humanos, sempre com a bênção da música de Gershwin. Dir-se-ia uma sinfonia sobre a transparência equívoca dos laços humanos.

  • cinemaxeditor
  • 1 Nov 2019 23:25

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