

“O Estrangeiro” – clássico de Camus revive em Veneza
François Ozon adapta o romance existencialista num filme a preto e branco que destaca o absurdo, a alienação e a injustiça colonial.
Adaptar um livro para o ecrã é sempre “uma traição”, diz François Ozon, mas ao trazer “O Estrangeiro” de Albert Camus ao Festival de Cinema de Veneza, o realizador espera gerar um novo debate em torno de um clássico francês.
Filmado a preto e branco, o filme segue Meursault, um jovem francês isolado que vive na Argélia colonial nos anos 30, mata um árabe numa praia e é julgado, com uma possível sentença de morte a pairar sobre ele.
Ozon, 57 anos, é um dos cineastas mais prolíficos de França, conhecido por obras como “Verão de 85”, “Correu Tudo Bem”, ou “Graças a Deus”. O seu último projeto nasceu após ter revisitado o romance de Camus, que leu pela primeira vez na adolescência.
“Apercebi-me do quanto o livro ainda tem ressonância nos dias de hoje”, disse à Reuters. “Lancei-me nesta adaptação com um pouco de medo, porque estou a lidar com uma obra-prima da literatura francesa.”
Publicado em 1942, o livro foi levado ao cinema em 1967 pelo realizador italiano Luchino Visconti, num filme protagonizado pelo seu compatriota Marcello Mastroianni.
Ozon disse que estava muito interessado em produzir uma versão em francês do clássico existencialista de Camus, embora estivesse consciente de que nem toda a gente iria apreciar o seu esforço.
“Adaptar um livro implica sempre um certo grau de traição, mas é uma reinterpretação noutra língua. Não é a linguagem da literatura, é a linguagem do cinema”.
Os temas do romance, como o absurdo, a alienação e a injustiça colonial, continuam a ser prementes.
“Quando se vê o que está a acontecer, as guerras, a ascensão da extrema-direita, os erros do colonialismo, a destruição da natureza, todas estas questões filosóficas estão no livro de Camus”.
O ator Benjamin Voisin, que interpreta Meursault, disse que foi extremamente difícil retratar uma personagem tão emocionalmente desligada e indiferente. “Foi difícil pedirem-me para nunca ‘atuar’. Mas tive de encontrar um compromisso entre o papel, a filosofia de Camus e o filme de Ozon”, disse.
“O Estrangeiro” é um dos 21 filmes que concorrem ao Leão de Ouro, que será entregue a 6 de setembro.