25 Mai 2019 22:07
Face ao palmarés do 72º Festival de Cannes, decorrente das decisões do júri oficial presidido por Alejandro González Iñárritu, é óbvio que as especulações (a começar pela minha) sobre as possibilidades de "It Must Be Heaven", de Elia Suleiman, poder chegar à Palma de Ouro estavam equivocadas.
Entenda-se: não é uma questão de jogar a "minha" Palma contra a Palma do júri. E escusado será sublinhar que qualquer avaliação deste género só pode suscitar diferenças de pontos de vista — Iñárritu teve, aliás, o cuidado pedagógico de recordar que aquele palmarés era apenas… o palmarés dos nove membros do júri.
Acontece que a ousadia de Suleiman, de uma só vez temática e estética, foi distinguida in extremis por um prémio que não estava previsto: uma "menção especial" que, em boa verdade, significa que a sua singularidade foi reconhecida, mas sem que o júri tivesse encontrado um lugar para o colocar na grelha habitual de prémios.
Dito isto, digamos também que, no ziguezague das suas escolhas, o júri não deixou de celebrar alguns dos títulos politicamente mais ousados que passaram em Cannes. Além do filme de Suleiman, penso, em particular, no prodigioso "Le Jeune Ahmed", dos irmãos Dardenne, sobre um jovem marcado pelo fundamentalismo religioso, e "Les Misérables", de Ladj Ly, centrado numa zona problemática dos subúrbios de Paris.
Isto sem esquecer, claro, a presença de Antonio Banderas no palmarés, distinguido pela sua composição em "Dolor y Gloria", de Pedro Almodóvar. Terá sido, creio, uma das escolhas mais consensuais (incluindo junto dos que, como eu, consideravam que a obra recente de Almodóvar se enredara numa deriva pouco interessante).
Resta lembrar que Terrence Malick e Quentin Tarantino ficaram de fora… E neste caso, de facto, só posso recorrer à mais desencantada subjectividade: o fulgor, a invenção e a emoção dos respectivos filmes — "A Hidden Life" e "Era uma Vez… em Hollywood" — parecem-me ilustrar alguns dos momentos mais notáveis da produção cinematográfica de 2019. Voilà.