

SING SING: o teatro como redenção
Inspirado num programa de reabilitação através das artes, “Sing Sing”, de Greg Kwedar, acompanha a história de homens encarcerados que encontram no teatro um novo propósito. Nomeado para três Óscares, incluindo melhor ator para Colman Domingo, o filme reflete uma realidade que encontra eco em Portugal, onde projetos semelhantes dão esperança aos reclusos.
“Sing Sing”, do realizador Greg Kwedar, parte de um programa desenvolvido para levar o teatro a uma prisão de alta segurança dos Estados Unidos.
Divine G (Colman Domingo), encarcerado na prisão de Sing Sing por um crime que não cometeu, encontra um objetivo ao atuar num grupo de teatro com outros homens detidos, incluindo um recém-chegado (Clarence Maclin, que se interpreta a si próprio).
O papel valeu a Colman Domingo a nomeação para o Oscar de melhor ator, uma de três nomeações conseguidas pelo filme que também marca presença nas categorias de melhor canção original e melhor argumento adaptado.
A ideia para o filme começou a germinar na cabeça do realizador em março de 2016, quando ajudava um amigo a produzir um documentário numa prisão de segurança máxima. Enquanto passavam pelos corredores, Kwedar viu um homem na sua cela a tomar conta de um cão, parte de um programa existente em várias prisões que junta cães resgatados a pessoas encarceradas.
“É um programa de reabilitação tanto para os animais como para os homens”, recorda Kwedar.
Aquilo que viu levou-o a investigar programas similares. Foi assim que conheceu a “Reabilitação através das Artes”, também conhecido como RTA, que encenava peças de teatro no estabelecimento prisional de Sing Sing.
Kenwar ficou impressionado com os resultados. Nos EUA, a taxa de pessoas que regressam à prisão após o encarceramento era superior a 60%. Entre os diplomados da RTA, a taxa era inferior a 5%.
Através do contacto com a RTA, descobriu o processo de escrita colaborativa envolvendo presos e encenadores e as pessoas envolvidas no programa. Com Clint Bentley, colaborador habitual e antigo colega na escola de cinema, Greg Kenwar deu início à escrita do argumento do que viria a tornar-se “Sing Sing”.
“Escrevemos muitas versões deste filme”, admite Kwedar. “Precisávamos de encontrar uma forma autêntica de contar esta história de amizade”.
Conheceram John Whitfield e Clarence Maclin, antigos participantes no programa da RTA. Whitfield, que estudou dança e representação nos anos 1970, foi condenado por um homicídio que não cometeu. Na prisão, escreveu três livros e foi um dos primeiros a participar no programa de reabilitação através das artes.
Maclin teve uma trajetória diferente, era um dos homens mais temidos de Sing Sing. Violento, extorquía dinheiro a elementos da população prisional e vendia drogas dentro da prisão. Envolveu-se na RTA por mero acaso, mas acabou por ficar. Hoje, trabalha como consultor e embaixador do programa.
Os cineastas acabaram por construíram o argumento de “Sing Sing” em redor destas duas personagens magnéticas e carismáticas que também colaboraram na escrita, dando a sua experiência para garantir a autenticidade dos diálogos e das situações.
No filme, Maclin interpreta a sua própria vida e outros antigos participantes no programa também aparecem no elenco ao lado de Coleman Domingo. Determinados a incluir as pessoas que realmente viveram aquela história, Kenwar e Bentley dizem que foi mais do que “uma escolha filosófica”, para eles é o reconhecimento do imenso talento encontrado nos antigos alunos da RTA.
O teatro nas prisões em Portugal
Em Portugal, o estabelecimento prisional do Linhó, no concelho de Cascais, tem um projeto idêntico ao que é mostrado no filme. A atriz Flávia Gusmão é a coordenadora e encontra semelhanças com a história que viu em “Sing Sing”:
É um projeto feito em parceria com o Teatro Experimental de Cascais e a Câmara Municipal de Cascais. O estabelecimento prisional do Linhó aceitou ser parceiro.
Em 2024, os reclusos prepararam “À Espera de Godot”, a peça de Samuel Beckett que tem sido objeto de adaptação por detidos noutros países:
Claro que eles se sentiram identificados quando começamos a ler a peça, porque, se há alguém que sabe o que é estar à espera, são, efetivamente, essas pessoas. Esse ponto de partida da identificação, acho que funcionou para quererem fazer a versão deles. Correu muito bem, acho que estamos todos muito contentes.
O teatro é apenas um de vários programas ligados às artes que funcionam no Linhó:
Tem o programa de dança, há muitos anos, com a Catarina Câmara, da Companhia Olga Flores, que está lá há muitos anos e faz um trabalho incrível, a meu ver. Aliás, alguns dos participantes que estão a fazer o projeto de teatro comigo já integram o projeto dela.
Flávia Gusmão acredita que a arte pode ser libertadora, capaz de ajudar na reabilitação e espera ter a oportunidade de continuar a levar o teatro às prisões:
É uma mais-valia para quem está dentro de uma prisão, porque o espaço da arte, é um espaço de liberdade. E continua a sê-lo, mesmo nessas condições.
+ conteúdos
-
Cinema
“Branca de Neve”: Disney tenta afastar polémicas
-
Curtas
A 25.ª Monstra no CINEMAX Curtas
-
Cinema
Morreu Émilie Dequenne a atriz de “Rosetta”
-
Cinema
SIGA A BANDA! – unidos pela música
-
Curtas
COMEZAINAS e PT.ES apresentam a Ronca
-
Cinema
Cannes 2025: os prováveis seleccionados
-
Cinema
BRINCAR COM O FOGO: os laços frágeis
-
Asiático
MICKEY 17: a resistência dos mais fracos
-
Cinema