07 Set 2023

O calvário dos migrantes que tentam chegar à Europa tornou-se o tema político dominante do Festival de Veneza, onde as janelas oferecem uma visão panorâmica sobre um Mediterrâneo que se tornou o túmulo de milhares de refugiados.

Os grandes representantes do cinema social e político há muito que se debruçam sobre as questões da integração e da xenofobia. Recentemente, os irmãos Dardenne, com “Tori et Lokita”, premiado em Cannes em 2022, ou Ken Loach, com “The Old Oak”, apresentado este ano na Croisette.

Mas o tema é tanto mais quente em Veneza quanto a Itália, dirigida por um governo de extrema-direita eleito há um ano, está na linha da frente no que diz respeito à questão dos migrantes que tentam chegar à Europa. Desde o início do ano, chegaram a Itália para cima de 105 mil pessoas, mais do dobro do número previsto para 2022.

De acordo com as Nações Unidas, mais de duas mil pessoas já morreram desde janeiro a tentar atravessar o Mediterrâneo, que se tornou a rota migratória mais mortífera do mundo.

Para dar um rosto a estes migrantes, Matteo Garrone, o realizador italiano de “Gomorra”, rodou “Io, Capitano”, um dos filmes que está na corrida ao Leão de Ouro.

“Io, Capitano”, conta a história de dois adolescentes senegaleses, Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall), primos que decidem deixar a família para tentar a sorte na Europa.

Sem pessimismo, o filme descreve os perigos que os esperam durante a viagem: caminhadas penosas através do Sara, tortura nas prisões líbias, escravatura… Por fim, ambos embarcam para Itália num barco sobrelotado.

“Io, Capitano”, que não se debruça sobre as razões que levam os jovens senegaleses a exilarem-se, pretende ser “um contraquadro do que costumamos ver”, explicou Matteo Garonne, na quarta-feira.

“Há anos que vemos chegar barcos vindos do Mediterrâneo. Por vezes, são resgatados. Outras vezes não”, diz. “Com o tempo, habituamo-nos a ver estas pessoas como números e esquecemo-nos que por detrás delas há todo um mundo, famílias, sonhos, desejos…”.

“A ideia foi colocar a câmara no lado oposto, ou seja, em África, apontando-a para a Europa, e contar a história da sua viagem mas, acima de tudo, vivê-la com eles. Para este road-movie iniciático, o realizador fez uma longa pesquisa, recorrendo a testemunhos de migrantes.

Para além disso, o filme questiona a responsabilidade dos europeus, que subcontrataram uma parte da sua política de migração aos regimes da margem sul do Mediterrâneo, ou que passam a moeda de troca entre Estados para evitar ajudar os barcos de migrantes em dificuldades.

  • CINEMAX - RTP c/ AFP
  • 07 Set 2023 11:26

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