19 Ago 2016 23:33
Como podemos observar no mais recente filme de Luca Guadagnino, "Mergulho Profundo", ele é um cineasta seduzido pela música, pelos seus enigmas e também pela sua transparência, uma transparência que, por assim dizer, está para além das palavras. Na sua longa-metragem anterior, "Eu Sou o Amor", lançada em 2009, Guadagnino usava várias composições do americano John Adams.
A música de John Adams envolvia um apelo paradoxal: por um lado, há nela qualquer coisa de muito concreto, quase como um jogo racional de sons e harmonias; por outro lado, o seu desenvolvimento é cúmplice de um gosto de espectáculo exuberante, assumidamente artificioso. Esta era, afinal, a história de uma família da indústria têxtil de Milão e da sua lenta decomposição emocional.
Com Tilda Swinton, Gabrielle Ferzetti e Marisa Berenson, "Eu Sou o Amor" é um melodrama, vibrante, envolvente, narrado num clima musical em que a referência à ópera é fundamental. Aliás, tal sugestão operática está presente logo no título: "Io Sono l’Amore" é uma expressão da ária "La Mamma Morta", da ópera "Andréa Chenier", de Umberto Giordano — precisamente a mesma que Tom Hanks escutava numa cena inesquecível do filme "Filadélfia" — por Maria Callas, claro.
As convulsões do cinema de Luca Guadagnino enraízam-se nesta musicalidade de extremos e, apetece dizer, extremamente poética. Nesta perspectiva, ele é um herdeiro directo de toda uma tradição que passa, por exemplo, por Luchino Visconti — uma tradição que se prolonga no mais moderno cinema italiano.