20 Dez 2017 17:50
Para muitos de nós, Harry Dean Stanton foi uma das revelações do primeiro “Alien”, de Ridley Scott, lançado em 1979 (entre nós com o subtítulo “O Oitavo Passageiro”). O certo é que nessa altura ele era já um actor com imensa experiência, tanto em televisão como em cinema — quase sempre assumindo personagens secundárias que adquiriam a misteriosa energia de figuras principais; um bom exemplo poderá ser o “western” de Sam Peckinpah, “Duelo na Poeira”, lançado em 1973, com banda sonora assinada por Bob Dylan.
Falecido a 15 de Setembro de 2017, contava 91 anos, Harry Dean Stanton foi, de facto, o actor de todas as transfigurações — e o filme “Lucky”, de John Carroll Lynch, fica como uma bela despedida. Admirávamo-lo pela capacidade paradoxal de, mesmo através de tais transfigurações, permanecer a mesma figura enigmática, potencialmente trágica, que transportava uma imensa e comovente memória — foi assim que Wim Wenders o filmou em “Paris, Texas”, em 1984, de tal modo que a música de Ry Cooder parece duplicar o misto de serenidade e angústia que vemos no rosto e nos gestos de Harry Dean Stanton [genérico e cena de abertura].
Não é possível escolher um, ou dois, ou três filmes que possam resumir a longa e contrastada carreira de Harry Dean Stanton — com mais de duas centenas de títulos, convém lembrar. Mas talvez possamos dizer que as gerações mais novas o associam de imediato ao universo de David Lynch, em particular a esse filme assombrado e assombroso que é “Twin Peaks – Os Últimos Sete Dias de Laura Palmer".
As memórias de "Twin Peaks" (incluindo, claro, a série televisiva) são indissociáveis da voz de Julee Cruise. Vale a pena recordar, a propósito, que quem tinha também uma voz admirável era o próprio Harry Dean Stanton. Em 2014, portanto aos 88 anos, editou mesmo um álbum que se chama “Partly Fiction” — são deambulações de delicado e contagiante intimismo [canção: "Blue Eyes Crying in the Rain"].