1 Mai 2018 23:56
A estreia mundial do filme "The Man Who Killed Don Quixote", no Festival de Cannes, a 19 de maio, está em risco. A 25 de abril, Paulo Branco e a Alfama Films, que têm a correr um processo onde afirmam serem detentores dos direitos do filme, apresentaram uma providência cautelar num tribunal de Paris a fim de impedir a sessão.
Dada a urgência, o pedido será analisado na próxima segunda-feira, 7 de maio, dia de abertura da edição 2018 do Festival de Cannes.
Assolado por desastres metereológicos e doenças de atores, o projeto de adaptação da história de Don Quixote por Terry Gilliam foi cancelado em pelo menos duas ocasiões, entre 1998 e 2016, altura em que Paulo Branco aceitou produzir o filme com a sua Alfama Films, sediada em França. Poucos meses após o anúncio da parceria, chegou o divórcio com Gilliam a acusar Branco de não ter reunido o dinheiro que prometera.
Na primavera de 2017, a rodagem começa finalmente, dividida entre Portugal e Espanha, com Adam Driver e Jonathan Pryce nos principais papéis, novos parceiros e o envolvimento da também portuguesa Ukbar Filmes, de Pandora Cunha Telles.
Mas Branco alega que houve quebra indevida de contrato e que os direitos do filme continuam a ser seus. Começa a batalha legal com o processo a dar entrada num tribunal de Paris. O dono da Alfama Films diz que "três decisões judiciais" lhe deram razão. Após recursos, a decisão final será conhecida a 15 de junho.
Os organizadores de Cannes mostram-se insatisfeitos com a situação. Num comunicado azedo, publicado segunda-feira, entre outras considerações, Pierre Lescure (Presidente) e Thierry Frémaux (Delegado Geral), acusam Branco de atitude "proeminente na esfera da imprensa e da justiça" e de basear a sua credibilidade em numerosas presenças" noutras edições do festival e na "proximidade com grandes autores" nele distinguidos.
Desvalorizam o caso, afirmando que "este tipo de disputas legais não são incomuns" e demarcam-se das mesmas justificando-se com o facto de ser missão do Festival de Cannes "selecionar os trabalhos puramente em bases artísticas" previlegiando a relação com os realizadores. Acusam ainda o produtor português de permitir que o seu advogado tenha proferido afirmações "intimidatórias e difamatórias".
Os dois homens fortes de Cannes mostram-se dispostos a "respeitar a decisão legal, qualquer que seja, mas declaram-se irrevogavelmente ao lado dos cineastas e, em particular, de Terry Gilliam". Numa referência ao facto de dois candidatos à Palma de Ouro deste ano, Jafar Panahi e Kirill Serebrennikov, estarem sob prisão domiciliária, e de "Rafiki", da secção Un Certain Regard, ter sido banido no Quénia, país natal da realizadora, Wanuri Kahiu, por o argumento incluir um romance lésbico, relembraram que "É mais importante do que nunca recordar que os artistas precisam de nós para apoiá-los, não atacá-los."
Paulo Branco respondeu quase de imediato. Noutro comunicado, reafirma que as "três decisões judiciais" existentes até agora "têm a força de caso julgado e impedem qualquer projecção ou exploração do filme em França sem o acordo do seu produtor".
Quando às declarações de Lescure e Frémaux, considera "indecente, para não dizer abjecto, que o Festival de Cannes, para se justificar, compare a situação de Terry Gilliam, que recusa respeitar decisões judiciais num Estado de Direito, à dos realizadores vítimas de repressão e censura nos seus países".
"O Festival de Cannes esquece assim que sem os produtores, que assumem os riscos financeiros, nem os filmes, nem o Festival existiriam", acrescenta.