11 Mai 2018 0:56
É bem provável que associemos o nome do francês Christophe Honoré (n. 1970) aos seus tíulos mais luminosos, quase sempre mais musicais, com destaque para "As Canções de Amor" (2007) e "Os Bem-Amados" (2011). O certo é que ele é autor de um universo cinematográfico assombrado por peculiares, por vezes muito perturbantes, cargas dramáticas. Assim é "Plaire, Aimer et Courir Vite", em competição em Cannes, provavelmente o seu filme mais perfeito.
Estamos perante uma vasta teia de personagens e comportamentos, revelando algumas convulsões da década de 1990. A história vai-se organizando a partir dos encontros/desencontros de um escritor parisiense, Jacques (Pierre Deladonchamps), e um jovem vindo da Bretanha, Arthur (Vincent Lacoste). O primeiro, mais velho, tem sida, um verdadeiro assombramento da época — apesar dos tratamentos, aguarda o seu fim; o segundo encontra nele um eco das suas próprias perplexidades e inquietações, num tempo de muitas transformações e enigmas.
O que é brilhante no trabalho de Honoré, também responsável pelo argumento e diálogos, é essa capacidade (dialéctica, sem dúvida) de desenhar todo um fresco histórico, não exactamente como "pano de fundo" para as relações entre personagens, antes a partir dessas relações e das suas muitas nuances sociais e afectivas. Reencontramos, assim, um genuíno cinema romanesco que tem em François Truffaut (1932-1984) uma referência emblemática — aliás, numa breve e tocante cena, Arthur visita a sua campa.
Mesmo sem cairmos na facilidade de "anteciparmos" o palmarés do festival (como se o júri fosse obrigado a reger-se pelos votos do espaço jornalístico e crítico…), não será arriscado supor que "Plaire, Aimer et Courir Vite" se poderá afirmar no interior desse palmarés como símbolo modelar de uma postura estética e ética profundamente ligado à tradição francesa. Além do mais, aconteça o que acontecer, o trabalho de Pierre Deladonchamps ficará como uma das grandes interpretações deste 71ª Festival de Cannes.