18 Abr 2015 23:08
Falecido em 1993, contava 73 anos, Federico Fellini foi (aliás, é) uma referência central na dinâmica criativa de vários cineastas italianos, de diferentes gerações. Recentemente, um desses cineastas, o veterano Ettore Scola, dedicou-lhe um filme intitulado "Que Estranho Chamar-se Federico". Em boa verdade, a biografia de Fellini assume, muitas vezes, uma dimensão autobiográfica — assim acontece nessa produção de 1987 que se chama, muito simplesmente, "Entrevista".
A justificação do título é muito simples. Ou seja: Fellini está a trabalhar em Roma, nos estúdios da Cinecittà, e nos intervalos concede uma entrevista a um grupo de jornalistas japoneses. Eles escutam-no, num misto de perplexidade e deslumbramento, mas a pouco e pouco compreendemos que o filme não segue exactamente as perguntas dos jornalistas — no fundo, este é um jogo de espelhos, uma entrevista de Fellini a Fellini.
Em boa verdade, "ENtrevista" é um dos filmes mais confessionais de Fellini — porque ele recua à sua adolescência, mas também ao fascínio da descoberta do cinema e de todas as formas de espectáculo, revisitando as histórias esquecidas da Itália dominada pelos fascistas de Mussollini. Daí a deliciosa ambiguidade do filme: é uma antologia de factos históricos, mas também uma colecção de memórias privadas, povoadas de personagens exóticas, enigmáticas, indecifráveis.
Para a história, "Entrevista" ficou como um genuíno filme-testamento de Fellini. O filme seguiu-se a "Ginger e Fred", rodado um ano antes, em 1986, com Marcello Mastroianni e que era uma espécie de ajuste de contas com a mediocridade da televisão italiana. Depois de "ENtrevista", Fellini apenas dirigiu "A Voz da Lua", em 1990, uma despedida suave e poética — aliás, para lá das convulsões dos seres humanos, o seu cinema sempre procurou um ponto de fuga distante, porventura inalcançável, em que a lei que triunfa é a lei da poesia.