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“Ferrari”: uma história humana e universal
O filme em torno da lenda do automobilismo Enzo Ferrari é, ao mesmo tempo, um melodrama sobre um homem e as suas complexidades.
04 Jan 2024
Depois de quase oito anos sem fazer cinema, Michael Mann apresentou no Festival de Veneza um dos seus projetos de vida. Em “Ferrari”, que começou a ser planeado ainda durante a década de oitenta do século passado, o realizador cruza o mundo dos carros e da competição, com os dramas familiares e pessoais de Enzo Ferrari.
Um homem que é praticamente uma lenda para os amantes do desporto automobilístico, mas que na visão de Michael Mann é também alguém com uma “história profundamente humana”:
“Quando se encontra um personagem tão dinâmico e operático como ele é, quanto mais específico e a fundo mergulhamos no homem, mais universal ele se torna. Descobri que muitas partes dele estão em oposição e isso para mim é como a vida.”
Sem pretensões de fazer uma abordagem biográfica, Michael Mann prefere concentrar-se num momento da vida de Enzo. O ano de 1957, quando a fábrica de carros de luxo está perto da falência e não consegue suportar os custos das corridas. Para recuperar o prestígio e salvar a empresa, o fundador da Scuderia decide apostar na dura prova das Mille Miglia, a corrida de resistência em estradas públicas italianas.
Adam Driver – “o motor interno dele é a dor”
No plano pessoal e familiar, Enzo perdeu o filho Dino, o casamento com Laura está a acabar e a nova família com a amante não poderá mais ser mantida em segredo.
“Dor, perda, amor, paixão e ambição. São coisas universais e na vida do Ferrari estão comprimidas de forma muito melodramática e operática”, explica o realizador.
Um personagem com muitas camadas e complexidades, que se tornou irresistível para Adam Driver. O ator diz que “o motor interno dele é a dor” e admite que é sempre um desafio desempenhar no cinema uma figura real, porque se trata de tentar compreender o homem, sem deixar que a figura real impeça o trabalho de representação.
“Acontece com qualquer pessoa real que representamos. Agarramos nas partes que abrem a nossa imaginação, mas a partir do momento em que elas se intrometem no nosso caminho ou refreiam um impulso, temos de parar com isso.”
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No elenco, brilha igualmente Penelope Cruz, no papel de Laura Ferrari, a mulher de Enzo, dividida entre o amor que os uniu e o afastamento que se impõe perante um casamento que já não resulta.
Patrick Dempsey, o famoso Derek da série “Anatomia de Grey”, um apaixonado pelo automobilismo que em 2014 se tornou piloto profissional e dono de equipas de competição, também quis fazer parte do projeto de Michael Mann. Interpreta Piero Taruffi, o piloto italiano que assume um lugar importante no plano da Ferrari para vencer as Mille Miglia.
“Ferrari” é um filme que vai além dos factos biográficos, sublinhando os dilemas pessoas de Enzo Ferrari, mas também o contexto e o lugar em que existiu. Em simultâneo, Michael Mann mostra que continua a ser um realizador empenhado em provocar emoções fortes, pela forma apaixonada como filma a velocidade e o drama nas corridas de automóveis.
Após filmes como “Heat – Cidade Sob Pressão”, “O informador”, “Ali”, ou “Inimigos Públicos”, Mann continua a encontrar histórias vibrantes nos mais diversos registos, e a conjugar elementos dramáticos com cinema de grande escala.