O cinema de Emir Kusturica cultiva o gosto do absurdo

4 Jan 2022 1:17

Nascido em Sarajevo, em 1954, Emir Kusturica é um cineasta sérvio cuja obra reflecte de forma, ora trágica, ora irónica, as convulsões por que têm passado os países da antiga Federação Jugoslava. O seu filme mais famoso, e também mais revelador dessa dimensão histórica, é "Underground", Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1995. Três anos mais tarde, portanto em 1998, Kusturica assinava "Gato Preto, Gato Branco", reposto em finais de 2021 nas salas portuguesas, em cópia restaurada.

O menos que se pode dizer de "Gato Preto, Gato Branco" é que se trata de um cruzamento inusitado, desconcertante e, por fim, exuberante de vários géneros. Numa zona nas margens do Danúbio tudo acontece, por assim dizer, entre as subtilezas do drama romântico e as convulsões da comédia mais surreal. De tal modo que a música adquire um papel central na construção narrativa, a ponto de servir para ir buscar um paciente ao hospital…


A pergunta justifica-se: será que podemos, então, classificar "Gato Preto, Gato Branco" como um filme musical? Em boa verdade, a história que nele se conta é mais policial que outra coisa, envolvendo o casamento do filho de um pequeno negociante com a irmã de um gangster, tudo para pagar uma dívida… O certo é que a música está presente em todas as cenas, quase sempre introduzindo elementos de ironia ou sátira — há mesmo uma canção que se intitula “Papá, não te atrevas a morrer numa sexta-feira".


"Gato Preto, Gato Branco" tem algo de colagem de contrários — a emoção de qualquer momento pode transfigurar-se no seu oposto, afinal reflectindo uma visão da condição humana em que coexistem a crueldade e a ternura. Na música, em particular, isso leva mesmo Kusturica a integrar temas das mais diversas origens, incluindo "Nowhere Fast", canção de "Estrada de Fogo", um filme americano de 1984 realizado por Walter Hill, uma aventura em tom rock’n’roll.

  • cinemaxeditor
  • 4 Jan 2022 1:17

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