31 Mar 2018 20:36
Agnès Varda voltou a ser notícia com “Olhares Lugares”, o filme que realizou em colaboração com o artista plástico que assina com as iniciais JR. Sendo um peculiar documentário, não podemos deixar de nos recordar que o trabalho documental é essencial na sua longa trajectória criativa. Mais do que isso: há muitas vezes nos seus documentários uma rara e preciosa dimensão intimista — o exemplo máximo será “Jacquot de Nantes” (1991).
“Era uma vez um menino que habitava numa garagem, em Nantes: a sua mãe gostava de cantar, o seu pai gostava de cantar, e ele também” — é a própria voz de Agnès Varda que nos apresenta a personagem de Jacquot, esse Jacquot que, adolescente, já fazia os seus filmes caseiros e organizava projecções para a família. Quem era ele? Pois bem, o marido de Varda e um dos nomes grandes da Nova Vaga francesa: Jacques Demy (1931-1990).
Falamos, afinal, do autor de obras-primas do musical como “As Donzelas de Rochefort” (1967), com Catherine Deneuve e François Dorléac. Varda evoca Demy, não apenas através dos seus filmes, mas também das suas vivências, em particular da infância e da adolescência, muito ligadas, precisamente, à cidade de Nantes — são memórias em que as canções populares, por exemplo de Charles Trenet, têm um papel central.
Varda combina música e silêncio, memórias documentais e memórias encenadas, celebrando a obra de Jacques Demy e lembrando também o essencial do seu projecto de vida. Ou seja: envelhecer um ao lado do outro, trocando afectos, fazendo filmes e escutando canções como “Le Temps des Cerises” — ainda e sempre com Charles Trenet.