8 Nov 2014 12:57
O menos que se pode dizer de um cineasta como Bruno Dumont é que, desde "A Humanidade" (1999) até "Camille Claudel 1915" (2013), o seu trabalho não deixa ninguém indiferente. "O Pequeno Quinquin", integrado na secção competitiva do Lisbon & Estoril Film Festival, é mais um esclarecedor exemplo da sua capacidade de desafiar modelos e estereótipos.
O primeiro desses modelos é de natureza simbólica. De facto, as aventuras do Pequeno Quinquin (Alane Delhaye) e seus amigos, misto de inicidentes burlescos e iminências trágicas, refazem a utopia do bom selvagem, agora num registo de bizarra confusão humana. De tal modo que a eventual visão idílica do mundo rural se apresenta, literalmente, virada do avesso.
O segundo modelo que Dumont transfigura é de produção: "O Pequeno Quinquin" é uma série de televisão (com chancela do canal Arte), ao mesmo tempo que possui o fôlego contagiante de uma saga cinematográfica. É, por isso mesmo, um bom exemplo de como é possível fazer televisão inteligente a partir de referências visceralmente populares — e tanto mais quanto, à sua maneira, Dumont reinventa toda uma tradição "bucólica" da produção cinematográfica francesa.