

Morreu a atriz Claudia Cardinale
Encantou Visconti e Fellini, brilhou em mais de 150 filmes e tornou-se ícone da beleza italiana. A estrela de "O Leopardo" e "Oito e Meio", morreu aos 87 anos.
Claudia Cardinale
, 1938-2025
Cativou Visconti e Fellini, enfeitiçou Delon, Belmondo e Mastroianni: encarnação da beleza italiana, Claudia Cardinale morreu terça-feira aos 87 anos. Iluminou mais de 150 filmes com a sua presença, incluindo os marcos “O Leopardo” e “Oito e Meio”.
Selvagem e maria-rapaz na juventude, esta italiana da Tunísia naturalizada francesa tornou-se, sem querer, uma estrela de cinema internacional.
“É a única rapariga simples e saudável neste meio de neuróticos e hipócritas”, disse um dia Marcello Mastroianni sobre ela.
Atuou no melhor do revivalismo italiano (Bolognini, Zurlini, Squitieri), brilhou em Hollywood (Edwards, Brooks, Leone), em França (Broca, Verneuil) e até na Alemanha com Werner Herzog e o seu maldito “Fitzcarraldo”.
“Tive a sorte de começar nos momentos mágicos do cinema. Todos os grandes realizadores foram meus mestres e nunca pedi nada a ninguém. Foram eles que me pediram”, resumiu ela à France Culture, aos 74 anos.
Nascida em La Goulette, perto de Tunes, a 15 de abril de 1938, filha de uma francesa e de um siciliano, Claude Joséphine Rose Cardinale falava francês, árabe e siciliano, mas foi no cinema italiano que se iniciou. Os realizadores que não gostavam da sua voz rouca e do seu sotaque francês dobraram-na até Fellini fazer ouvir a verdadeira voz da atriz em “Oito e meio” (1963).
Aos 17 anos, um concurso de beleza que ganhou sem sequer ser candidata virou a sua vida de pernas para o ar: “A mais bela mulher italiana de Tunes” ganhou uma viagem ao Festival de Cinema de Veneza, onde causou sensação.
“Eu não queria ir para o cinema. Era a minha irmã que queria. Mas elas insistiram tanto (…) que o meu pai cedeu”, confidenciou à France Inter.
Assina contrato com o produtor Franco Cristaldi. No cenário da comédia de culto “O Pombo” (1958), de Monicelli, descobre que estava grávida. Anos mais tarde, confessou que tinha sido violada.
“Heroína de um conto de fadas”
O produtor obrigou-a a esconder a gravidez. Após dar à luz em segredo em Londres, convenceu-a a confiar a criança aos pais: Patrick seria oficialmente o irmão mais novo de Cláudia até ela revelar a verdade, sete anos mais tarde.
Tinha apenas 22 anos quando Visconti a escolheu para o filme “Rocco e os Seus Irmãos” (1960). Mandou-a pintar os olhos de preto e ensinou-lhe o ofício. Cardinale segui-lo-ia para todo o lado: em “O Leopardo”, em 1963, brilhou entre Burt Lancaster e Alain Delon. Ao mesmo tempo, filmava outra obra-prima, “Oito e Meio” de Fellini.
“Visconti, preciso e meticuloso como no teatro, falava-me em francês e queria que eu fosse uma morena de cabelo comprido. Fellini, que era desarrumado e não tinha guião, falou-me em italiano e queria que eu fosse uma loira de cabelo curto. Foram os dois filmes mais importantes da minha vida”, contou ao diário francês Le Monde.
Aos 23 anos, fez uma entrada sensacional em Cannes com “A rapariga da Mala” de Zurlini e “A Herança” de Bolognini: foi confundida com uma Bardot morena. Dez anos mais tarde, “BB” e “CC” jogaram juntas na poeira em “As Rainhas do Petróleo”.
“Tornei-me heroína de um conto de fadas, o símbolo de um país cuja língua mal falava”, escreveu a atriz na sua autobiografia.
Exigida por Hollywood, onde se recusou a instalar-se, seduziu os americanos em “A Pantera Cor-de-Rosa”, depois em “O Maior Circo do Mundo”, de Henry Hathaway, no qual interpretou a filha de Rita Hayworth.
Depois de “Sandra”, de Visconti, em que usou o vestido de noiva da mãe do realizador, e de “Os Profissionais”, com Burt Lancaster, foi a heroína de “Era Uma Vez no Oeste” (1968), de Sergio Leone, a única mulher entre Charles Bronson e Henry Fonda.
O napolitano Pasquale Squitieri, seu companheiro durante quase 30 anos, seu “único amor” e pai de sua filha Claudia, realizou dez filmes para ela entre 1974 e 2011.
Em 2017, o Festival de Cannes escolheu uma fotografia da sua juventude para o seu cartaz, prestando homenagem a “uma atriz aventureira, uma mulher independente, uma cidadã empenhada”.