02 Mar 2024
Durante décadas, os inseparáveis irmãos Taviani realizaram filmes marcantes do cinema italiano, incluindo a obra-prima “Padre padrone”, que ganhou a Palma de Ouro em Cannes em 1977. Vittorio morreu em 2018. O seu irmão Paolo seguiu-o na quinta-feira com 92 anos.
“Perdemos um grande mestre do cinema italiano. Com o irmão Vittorio (falecido aos 88 anos), realizou filmes inesquecíveis, profundos e empenhados que se tornaram parte do imaginário coletivo e da história do cinema”, declarou o presidente da Câmara de Roma, Roberto Gualtieri.
O funeral secular de Paolo Taviani, que faleceu em Roma após “breve doença”, realiza-se segunda-feira, segundo a imprensa italiana.
Os irmãos Taviani formaram uma dupla rara na história da sétima arte. Juntos, escreveram quinze longas-metragens marcadas por um estilo altamente literário, misturando história, psicanálise e poesia.
“Padre padrone” é a adaptação do romance autobiográfico de Gavino Ledda sobre um jovem pastor que escapa ao controlo despótico do pai que, por necessidade financeira, o obrigou a abandonar a escola, deixando-o analfabeto até aos vinte anos.
“Paolo Taviani era metade de um duo encantador (…) com o irmão mais velho, Vittorio. Os seus filmes tinham uma graciosidade, um rigor moral e uma poesia inimitáveis”, comentou Gilles Jacob, antigo presidente do Festival de Cannes, na quinta-feira à noite.
Após a morte do irmão, Paolo ainda encontrou forças para rodar um último filme sozinho, “Leonora Addio”, apresentado na Berlinale em 2022. Durante a preparação, Vittorio, a quem o filme é dedicado, já não estava fisicamente a seu lado, mas “estava comigo”, disse o patriarca do cinema italiano numa entrevista à AFP por altura do festival.
Fortemente inspirados pelo mestre do neorrealismo Roberto Rosselini, os irmãos, filhos de um advogado antifascista, interessaram-se por temas sociais desde o início da carreira, nos anos 1960.
“O Vittorio e eu decidimos fazer filmes quando eu tinha dezasseis anos e ele dezoito, quando vimos o ‘Païsa’ de Rosselini”, disse Paolo à AFP. “Apercebemo-nos de que o cinema podia mudar as nossas vidas e revelar quem éramos realmente”.
“Anos mais tarde, ganhámos a Palma de Ouro por ‘Padre Padrone’, apresentada por Rosselini, e foi como se um círculo se fechasse”, acrescentou.
Nascidos na Toscana, Paolo e Vittorio mudaram-se para Roma na década de 1950 e eram apaixonados pelo cinema desde muito cedo. Um dos seus primeiros filmes, “Les Subversifs” (1967), prefigurava os acontecimentos de 1968, na forma de uma investigação sobre o Partido Comunista Italiano aquando do funeral de um dos seus fundadores, Palmiro Togliatti.
Inspirados por Brecht, Pasolini e Godard, realizaram “Sob o Signo do Escorpião” (1969), o seu primeiro filme a cores, com Gian Maria Volontè, que foi também o seu primeiro grande êxito.
Após a coroação de “Padre Padrone” em Cannes, regressaram à Croisette em 1982 com “A Noite de São Lourenço”, um filme com uma atmosfera de conto de fadas que ganhou o Grande Prémio do Júri.
Em 2012, os Taviani ganharam o Urso de Ouro no Festival de Berlim com “César Deve Morrer”, em que os reclusos da prisão de Rebibbia, em Roma, representavam a tragédia de Shakespeare.
Em 1986, no Festival de Veneza, receberam também um Leão de Ouro em homenagem a toda a sua carreira.