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“Volveréis – Voltareis”: a comédia romântica que celebra a separação
Em entrevista ao CINEMAX RTP, o realizador espanhol Jonás Trueba reflete sobre memórias de infância e fala da relação entre vida e cinema numa história que desafia os clichês do amor e da fidelidade e onde se mistura o humor com uma pitada de utopia.
13 Fev 2025
E se um dia fosse convidado para uma festa de separação? É o que acontece na comédia espanhola “Volveréis – Voltareis”, a história de um casal que se vai separar e decide reunir a família e os amigos para assinalar o acontecimento.
Este mote para um filme surgiu ao realizador Jonás Trueba a partir de memórias de infância e uma frase que se lembra de ouvir ao pai:
O filme nasce de uma ideia que o meu pai me disse quando eu era muito novo. Ele disse-me esta frase como um conselho para a vida, não para um filme, mas para a vida.
Guardei estas palavras durante muitos anos, até me aperceber que esta frase, esta ideia de celebrar a separação, podia ser o enredo de um filme, ser a premissa de um filme que pudesse dialogar com esses filmes clássicos de Hollywood. Com os casais dessas comédias românticas que eu tinha crescido a ver.
Foi como uma combinação, como algo que de repente fez um clique na minha cabeça.
É bom pensar que, por vezes, os filmes nascem de algo que ouvimos e que de repente se materializam.
JONÁS TRUEBA: Gosto de construir filmes baseados em experiências…
Além de se focar na vida quotidiana, o cineasta espanhol, Jonás Trueba, teve interesse em fazer um filme que toca a utopia e o absurdo que é uma festa para festejar uma separação:
A maior parte do cinema mundial tende para a espetacularização. Gosto de reagir contra isso e dizer humildemente que os filmes também podem ser feitos de outra forma, que também podem estar mais próximos da vida quotidiana, das pessoas e das suas pequenas ilusões.
Este filme não é estritamente realista. Certamente que não é assim tão fácil uma separação desta forma como é mostrado no filme. Mas é uma pequena utopia da vida quotidiana.
As utopias também parecem ter de ser construídas com grandes ideias utópicas, de sociedades. Mas acho que também podemos falar de utopias da vida quotidiana, certo?
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Ale e Alex, ela é realizadora, ele é ator. São as personagens principais de “Volveréis – Voltareis”. As interpretações são de Itsaso Arana e de Vito Sanz, que já tinham estado juntos em “A Virgem de Agosto” e “Têm de Ir Vê-la”, os filmes anteriores de Jonas Truéba.
Desta vez, participaram igualmente na escrita do argumento. O realizador quis envolvê-los desde o princípio e reconhece identificar-se neste filme:
Há uma identificação. Uma proximidade muito evidente entre mim e as comédias românticas.
Ale é uma cineasta, tal como eu, que está no processo de montagem e pós-produção de um filme. Gosto de construir filmes baseados em experiências, ou coisas que poderíamos viver.
Escrevi o filme com estes dois atores, Arana e Sanz. Construímos o filme a partir das nossas experiências. A Arana tinha feito um filme como realizadora e eu tinha-a visto montar o seu filme. Ela foi uma inspiração para mim.
O filme tem coisas dela, coisas minhas, coisas do Sanz e de outros amigos cineastas.
Há alguma paródia, humor, rimos de nós próprios, dos nossos disparates, das nossas tristezas, do nosso quotidiano e também da confusão que vivemos entre a vida e o cinema, entre a nossa profissão, o nosso trabalho e o amor em casal.
Os filmes românticos servem de inspiração a Jonás Trueba, mas “Volveréis – Voltareis” não segue os padrões clássicos. Entre momentos de ironia e de humor a uma história de fidelidade:
O filme tem uma premissa de comédia romântica. Baseia-se no nosso desejo de fazer uma comédia romântica, mas à nossa maneira, não à maneira clássica. Por isso o filme acaba também por ser outras coisas.
Não é só uma comédia, mas tem muitos elementos de comédia, de comédia romântica. É um filme que reflete sobre como viver em casal, como viver o amor e o trabalho. Como o trabalho e o amor se confundem. E como a vida e o cinema se confundem também.
É ainda um filme que fala da ideia de fidelidade, de como podemos manter-nos fiéis a nós próprios e às pessoas com quem vivemos e trabalhamos. Não é fácil manter a fidelidade e manter o amor quando se passam muitos anos.
JONÁS TRUEBA: Se o meu pai não quisesse participar, não teria feito este filme. O verdadeiro motivo [para realizar “Volveréis”], era filmar o meu pai.
O realizador espanhol Jonás Trueba insiste no filme na ideia de repetição. Acredita que é um caminho para a perfeição:
A ideia de repetição também está no filme. Repetir como eu repito. Com os mesmos atores, na minha cidade, nos mesmos sítios.
O filme elogia a repetição, o que tem a ver com o quotidiano. Ou seja, é um filme que fala de como nos repetimos constantemente no nosso dia a dia. Estamos num processo de repetição, dos mesmos diálogos. Frequentamos as mesmas pessoas. Estamos num processo de repetição, o que para mim não é uma rotina. Não é uma coisa má nem negativa. É uma coisa positiva.
Acho que a repetição, na realidade, leva sempre à evolução. É uma forma de fidelidade e de amor. Acho que é disso que o filme fala. Uma ideia de repetição positiva. Uma ideia de repetição construtiva.
O premiado realizador espanhol, Fernando Trueba, tem a personagem do pai da noiva. É o primeiro papel enquanto ator. Jonás quis que o pai entrasse no filme:
Para mim, era fundamental a sua presença. Se ele não quisesse participar, não teria feito este filme. O verdadeiro motivo, era filmar o meu pai. Era muito claro para mim que tinha de ser ele. Quase como um jogo, um desafio entre nós.
Ele é um grande cineasta. E além de ser cineasta, adora cinema. Em particular, este género, as comédias românticas clássicas de Hollywood. Gosta muito delas e mostrou-mas quando eu era criança.
Há um diálogo entre nós, uma relação. Para mim, é divertido e, ao mesmo tempo, simbólico. É importante que ele possa interpretar a personagem do pai da noiva, que é quase um cliché, um estereótipo dentro desse género de filmes, de comédias românticas. Para mim, fechou-se o círculo vital entre pai e filho, mas também para nós enquanto cineastas.
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Jonás Trueba é filho da produtora Cristina Huete e do realizador Fernando Trueba, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1993 com o filme “Belle Époque”, uma longa-metragem filmada em Portugal.
A ligação de Jonás com Lisboa vem desde miúdo, quando acompanhavam os pais nas filmagens. O filme “A Cidade Branca”, do realizador suíço Alan Tanner, também ajudou a criar laços com a capital portuguesa:
Alan Tanner filmou A Cidade Branca, graças a Paulo Branco. É um filme que me marcou muito. Este cineasta suíço marcou-me muito. Eu chamo-me Jonás por causa de um filme dele.
O meu pai deu-me este nome em homenagem ao filme “Jonas, que fará 25 anos no ano 2000”. A seguir, o Tanner, filmou em Lisboa “A Cidade Branca”, com produção do Paulo Branco. É um filme tão deslumbrante para mim, que a imagem que ainda tenho de Lisboa está ligada a esse filme.
Depois, aprendi a admirar o cinema português, em geral.
“Volveréis – Voltareis” estreia esta semana nos cinemas portugueses.