joao lopes
5 Dez 2014 20:30
Em tempos recentes, a grande tradição da comédia made in USA, convenhamos, nem sempre tem sido muito bem tratada. Entre a banal acumulação de anedotas mais ou menos obscenas com adolescentes e as variações menores sobre os modelos da "stand up", a herança de Chaplin, Keaton ou Lewis tem sido, no mínimo, algo esquecida…
Daí que se saúde a energia burlesca de "Doidos à Solta de Novo", sequela com que os irmãos Bobby e Peter Farrelly reencontram (vinte anos depois!…) as personagens de Lloyd Christmas e Harry Dunne, dois adultos eternamente infantis, ligados por uma amizade que nada nem ninguém consegue abalar.
Claro que o essencial se joga, aqui, a partir das tensões que se instalam entre as acções dos protagonistas e todas as exigências que a ordem (social, familiar, moral) lhes impõe — em boa verdade, Lloyd e Harry não distinguem a diferença entre o gesto infantil e uma responsabilidade adulta, vivendo, com bizarro humor, a sua apoteótica inadaptação.
Seja como for, não é possível imaginar um filme como este sem ter em conta a excelência dos respectivos intérpretes: Jim Carrey (Lloyd) e Jeff Daniels (Harry) são, de facto, dois brilhantíssimos actores que, além do mais, possuem uma versatilidade rara — lembremos Carrey em títulos de ambíguo dramatismo como "Homem na Lua" (1999), de Milos Forman, ou veja-se Daniels na série de Aaron Sorkin, "The Newsroom" (a passar no canal TV Séries).
Acima de tudo, "Doidos à Solta de Novo" devolve à comédia americana um sentido de timing que é decisivo. Por vezes, diz-se que, precisamente por causa da sua métrica narrativa, a comédia é "mais difícil" que o drama… Não sei se fará sentido acentuar essa oposição (em última instância, a meu ver, demasiado simplificadora); em todo o caso, contemplar a arte de performers como Carrey e Daniels é sempre motivo de profunda admiração.