Julianne Moore sob a direcção de Cronenberg — sonhos e fantasmas do mundo do cinema

crítica

O baile de máscaras de Hollywood

David Cronenberg filma os bastidores de Hollywood num misto de crueldade e sarcasmo — "Mapas para as Estrelas" é um dos mais espantosos retratos que já se fizeram da "fábrica de sonhos" da Califórnia.

Drama

E se Hollywood fosse uma imensa, perversa e incestuosa família?… Não apenas em sentido estrito, mas como comunidade de relações e cumplicidades em que cada personagem só parece existir em função dos laços que favorecem o fecho do seu próprio espaço íntimo?

Estranho? Estranhíssimo, inquietante, por vezes sarcástico… Como David Cronenberg disse na sua conferência de imprensa em Cannes, "Mapas para as Estrelas" não deverá ser visto como um retrato específico de Hollywood, uma vez que poderia ter lugar em Wall Street ou Washington: "Trata-se também dos que lutam para ter sucesso e ganhar dinheiro".

Estamos, assim, perante uma crónica cruel em que a miragem do dinheiro marca todos os comportamentos, mesmo das personagens tradicionalmente tidas como mais "inocentes" (veja-se esse pequeno monstro que é o adolescente vedeta de cinema). Nessa perspectiva, mesmo compreendendo as reticências de Cronenberg, como não ver em "Mapas para as Estrelas" uma viagem dantesca aos bastidores da fábrica de sonhos da Califórnia?

"Mapas para as Estrelas" consegue, assim, essa proeza rara de dar a ver uma paisagem onde se acumulam os artifícios (a descrição das rodagens é de uma minúcia delirante), ao mesmo tempo que todas as personagens lutam por um grão de verdade que, eventualmente, as resgate do baile de máscaras em que, voluntariamente ou não, são levadas a existir.

Nesta perspectiva, a personagem da actriz Havana Seagrand, interpretada pela prodigiosa Julianne Moore, ocupa um lugar nuclear na estrutura de "Mapas para as Estrelas" — ela é aquela que vive a sua condição profissional através do fantasma da mãe (que também foi actriz), nessa medida pressentindo uma verdade que, afinal, lhe escapa entre os dedos (e os filmes).

Raras vezes vimos o aparato industrial (e também a sua máquina pulsional) do cinema assim retratado. E, face à complexidade do trabalho de Moore, convenhamos também que já vimos muito boa gente ganhar Oscars por infinitamente menos… Sem esquecermos, claro, que a direcção de actores — Robert Pattinson, Mia Wasikowska, John Cusack, etc. — é, como sempre, modelar.