joao lopes
5 Fev 2015 1:05
O título original do filme "O Meu Nome É Alice" recorda-nos que a personagem central vive um combate para preservar a sua própria identidade: "Still Alice", tal como na expressão I’m still Alice ("ainda sou Alice") é, de uma só vez, um grito de desespero e um apelo a que os olhares exteriores a continuem a reconhecer — Alice sofre de Alzheimer e, entre o ser e o não ser, tudo vacila dentro e fora de si.
Digamos, para simplificar, que colocar em cena alguém como Alice seria sempre um desafio imenso. Por um lado, tratava-se de contornar as facilidades moralistas dos registos televisivos que investem a doença como símbolo "obrigatório" de uma experiência abstracta e universalista; por outro lado, era importante que, no plano da dramaturgia, a singularidade de Alice existisse, não apesar das outras personagens, mas também através delas.
"O Meu Nome É Alice" é esse filme brilhante que consegue encontrar um equilíbrio, instável, mas fascinante, entre todos esses factores que estão em jogo. E escusado será sublinhar que a composição de Julianne Moore, como Alice, é um daqueles trabalhos que transcende todos os clichés, expondo-nos à intensa pluralidade de uma personalidade e ao seu angustiado apego à vida.
Seja como for, a dupla de realizadores — Richard Glatzer e Wash Westmoreland — sabe que a saga de Alice depende das fundamentais pontuações proporcionadas pelas restantes personagens, em particular as duas filhas (Kristen Stewart e Kate Bosworth) e o marido (Alec Baldwin). E o menos que se pode dizer é que todos eles são tratados com metódica atenção pela mise en scène, emprestando a "O Meu Nome É Alice" uma tocante dimensão coral.
Todas as previsões dos Oscars apontam para a vitória de Julianne Moore na categoria de melhor actriz. E embora eu resista a qualquer abordagem do assunto através de fórmulas de tribunal (deixemos a "justiça" dos resultados a cargos dos comentadores de futebol…), não há dúvida que a sua vitória anunciada irá consagrar o mais perene valor do cinema (americano ou não): a vibração irredutível daquele(a) que se transcende, interpretando as vivências de outro(a).