O Oeste já não é o que era

E faz sentido que se dê o devido destaque a tais condições. Não por qualquer razão pitoresca, muito típica das descrições anedóticas que algum jornalismo de "famosos" gosta de promover em torno do cinema (e não só). Antes porque, de facto, a opção pela rodagem em cenários naturais, e não fabricados por métodos digitais, constitui, aqui, um elemento fundamental de todo o projecto.

Para adaptar o livro de Michael Punke, sobre o caçador Hugh Glass, no começo do séc. XIX, Alejandro González Iñárritu definiu como essencial princípio de trabalho a filmagem em cenários naturais, de modo a fazer valer os respectivos elementos, não como banal efeito "decorativo", antes como uma entidade plural, contraditória e, acima de tudo, resistente à acção dos humanos (incluindo, claro, os que a registam em cinema).

O resultado é uma narrativa épica em que a personagem de Glass (que, por certo, vai valer um Oscar a Leonardo DiCaprio), a sua mulher índia (Grace Dove) e o filho Hawk (Forrest Goodluck) definem uma família que, por si só, pode simbolizar o tempo da acção — um tempo de muitas diferenças e contrastes em que assistimos a encontros/desencontros de brancos e índios que estão muito para além do maniqueísmo do "western" mais convencional. Em boa verdade, deparamos aqui com um Oeste que já não corresponde a qualquer visão purista ou redentora, mas sim à contundente verdade de uma permanente luta pela sobrevivência.

"O Renascido" é mesmo um filme que nos permite reencontrar a sensibilidade de alguns "westerns" dos anos 60/70, de cineastas como Arthur Penn, Sam Peckinpah ou Sydney Pollack, apostados em (re)escrever a história da expansão para Oeste como uma saga dupla: por um lado, um combate incessante com uma natureza cruel e inóspita; por outro lado, a tentativa de encontrar um equilíbrio moral e existencial numa terra ainda à procura de um sólido enquadramento legal.