Antonio Bolívar e Brionne Davis — redescobrindo as paisagens da Amazónia


joao lopes
9 Abr 2016 23:05

Nos circuitos internacionais, há filmes que são naturalmente beneficiados pelos prémios que recebem. Exemplo próximo: o magnífico "O Filho de Saul", de Laszlo Nemes, que valeu à Hungria o Oscar de melhor filme estrangeiro. Outros haverá que correm o risco de ser penalizados por… não terem ganho — será o caso de "O Abraço da Serpente", de Ciro Guerra, outro dos nomeados (em representação da Colômbia) para o mesmo prémio.

De facto, estamos perante um objecto de cinema realmente invulgar. E não apenas por se tratar de um filme com imagens a preto e branco (admiráveis, convém acrescentar), hoje em dia muitas vezes encaradas como um "preciosismo" mais ou menos dispensável. Sobretudo porque num tempo em que as causas ecológicas são muitas vezes sustentadas por discursos simplistas, meramente panfletários, "O Abraço da Serpente" se apresenta como um genuíno projecto de regresso à natureza.



Trata-se, então, de evocar a singular convivência de dois exploradores da Amazónia — o alemão Theodor Koch-Grunberg (Jan Bijvoet) e o norte-americano Richard Evans (Brionne Davis) — com Karamakate, sobrevivente de uma tribo da Amazónia que se cruzou com aqueles dois homens, o primeiro no começo do séciulo XX, o segundo já na década de 40 (daí que a personagem de Karamakate seja interpretada por dois actores: Nilbio Torres e Antonio Bolívar).

O filme de Ciro Guerra consegue a proeza de estabelecer uma relação carnal com os elementos paisagísticos a que não poderemos deixar de reconhecer um valor visceralmente documental. Ao mesmo tempo, através de Karamakate e da sua visão do mundo vai surgindo uma dimensão para além do realismo que talvez possamos definir como uma concepção mágica da própria natureza. "O Abraço da Serpente" é, afinal, um filme sobre as cumplicidades, e também as formas de estranheza, dos seres humanos.

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