16 Jun 2016 14:42
É bem certo que o mercado português tem mantido alguma relação com a riqueza clássica do cinema indiano — o ano passado, por exemplo, tivemos mesmo a possibilidade de ver em sala (e depois em DVD) alguns títulos admiráveis do mestre Satyajit Ray (1921-1992). Face à estreia de "Deusas em Fúria", de Pan Nalin, o mínimo que se pode dizer é que estamos perante uma boa surpresa: mesmo através da sua retórica narrativa, o filme toca-nos pelos temas sociais e políticos que o atravessam.
Em cena está a reunião de várias mulheres relativamente jovens. Com actividades muito diversificadas, desde o próprio cinema (a lendária indústria de Bollywood) até às grandes empresas, passando pela criação musical, elas são a expressão de uma pluralidade de comportamentos e ideias que reflecte uma evidente vitalidade — em todo o caso, a ligeireza das cenas iniciais vai ser abalada pela emergência de inesperadas formas de violência.
O trabalho de Pan Nalin está marcado por muitas soluções mais ou menos mecânicas e previsíveis, até mesmo no plano meramente técnico (por exemplo, em algumas sequências, a utilização da câmara à mão surge como uma solução fácil e redundante). O certo é que, à medida que a acção avança, a comédia dá lugar ao drama: personagens e espectadores são confrontados com alguns dados perturbantes, todos eles enraizados numa cultura antiga que menospreza e instrumentaliza as mulheres — no limite, a violação é assumida como forma "natural" de comportamento (e algumas notícias trágicas que têm chegado da Índia são sintoma disso mesmo).