Jessica Chastain e Mark Strong — no labirinto político de Washington


joao lopes
14 Jan 2017 19:50

Será que existe alguém que, no actual cinema americano, se defina como discípulo da sofisticada escrita de Aaron Sorkin ("Os Homens do Presidente", "A Rede Social") e, em particular, da sua capacidade de desmontar as máscaras dos bastidores da cena política? Mais do que isso: onde está alguém que, no trabalho do argumento, possa ser encarado como herdeiro do grande David Mamet?

Será prematuro considerar que o nome de Jonathan Perera seja a resposta a tais questões — afinal de contas, "Miss Sloane" representa apenas a sua estreia como argumentista. O certo é que este ex-advogado (que foi também professor de inglês na China e na Coreia do Sul…) revela uma agilidade invulgar: o filme, dirigido com sobriedade por John Madden, consegue expor, num misto de crueldade e ironia, os mecanismos do poder e, em especial, a rede de compromissos nem sempre muito transparentes em que alguns legisladores se envolvem.
Nada disso resultaria como resulta, se a personagem central, Elizabeth Sloane, não nos surgisse através de uma prodigiosa interpretação de Jessica Chastain. Ao assumir a personagem de uma especialista na gestão de lobbies, em Washington, ela consegue definir um ser humano tanto mais complexo e contraditório quanto a sua acção visa uma delicadíssima questão. A saber: a mobilização de apoios para uma nova lei sobre as condições de acesso de cada cidadão americano às armas de fogo. Isto sem esquecer que "Miss Sloane" tem também uma colecção de magníficos secundários, incluindo Mark Strong, Michael Stuhlbarg, Gugu Mbatha-Raw, Alison Pill e John Lithgow.
É pena que "Miss Sloane", lançado entre nós com o subtítulo pouco inspirado de "Uma Mulher de Armas", esteja a ser tratado como um parceiro secundário na temporada de prémios (já vimos actrizes ganharem Oscars por infinitamente menos do que a extraordinária performance de Chastain). E tanto mais quanto a sua visão clínica do território político de Washington é, escusado será sublinhá-lo, mais actual do que nunca — esperemos que ainda haja espectadores para procurar o menos óbvio. 

+ críticas