Nuno Lopes protagoniza o novo filme de Marco Martins


joao lopes
10 Mar 2017 1:20

De que falamos quando falamos de realismo cinematográfico português? Se considerarmos as respostas implícitas no filme “São Jorge”, de Marco Martins, diremos que falamos, antes do mais, do incremento obsessivo de sinais capazes de reflectir a degradação física e humana de um espaço socialmente marginal. Afinal de contas, a figura central, interpretada por Nuno Lopes, é um pugilista que não quer perder o seu filho, tentando sobreviver num mundo de violência latente (muitas vezes explícita), integrando uma empresa especializada em colectas de dívidas por meios nem sempre muito pacíficos…

Colocando esses elementos em jogo, o filme parece apostar num certo negrume — em sentido literal e simbólico — que não podemos deixar de associar a modelos de “thriller”, mais ou menos psicológico, enraizados na tradição de Hollywood. Desde a composição “neutra” de Nuno Lopes, como se fosse um fantasma errante e errático, até à valorização dos detalhes cenográficos, o impulso realista acaba por se desviar para uma certa ostentação maneirista: interessa menos a complexidade da realidade retratada e mais a valorização formalista dos seus sinais.

Tudo isto faria de “São Jorge” mais um exemplo de um cinema português que, apesar dos equívocos por resolver na sua démarche estética e narrativa, possui, pelo menos, o mérito de se demarcar da facilidade de outras propostas que se limitam a tentar rentabilizar (?) clichés, ora dramáticos, ora humorísticos, do esgotado panorama de telenovelas, “stand-up” e afins… Afinal de contas, a relação com o aqui e agora português constitui um desafio que vale sempre a pena enfrentar.

Acontece que o filme se apresenta também como uma reflexão sobre os tempos da Troika em Portugal, abrindo e fechando com legendas que referem esse período, inclusive com dados de natureza estatística. São informações que acabam por suscitar a necessidade de algum tipo de contextualização/discussão desse período que o filme, em última instância, não tem para dar (e que, provavelmente, nem sequer procura). Registe-se, apesar de tudo, a vontade de abordar a realidade portuguesa sem ceder aos lugares-comuns novelescos que dominam o nosso quotidiano social e cultural.

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