28 Set 2017 15:17
Como definir a importância política de um filme? Pela sua "mensagem"? Pelo seu grau de "militância"? Qualquer uma dessas hipóteses corre o risco de apenas instalar ou reforçar clivagens que, em última instância, banalizam a própria experiência cinematográfica. Digamos, então, que a sua importância pode passar pelo modo como apela ao espectador para pensar politicamente o mundo à sua volta — "Sea Sorrow", de Vanessa Redgrave, é um desses filmes.
Que levou a lendária actriz de filmes como "Blow-up" (1966), "Isadora" (1968) ou "Regresso a Howards End" (1992) a assumir pela primeira vez a realização de um filme? A resposta é linear e está devidamente esclarecida no próprio filme: Vanessa Redgrave prolonga o seu discurso humanitário através de um dramática chamada de atenção para a crise dos refugiados na Europa, muito em particular discutindo aquilo que considera uma actuação deficiente do governo britânico.
Apresentado numa sessão especial do Festival de Cannes, "Sea Sorrow" poderá descrever-se como uma pedagógica demarcação das imagens mais ou menos breves e aceleradas que, todos os dias, consumimos no espaço televisivo. Para Vanessa Redgrave, é importante testemunhar a partir do conhecimento directo de pessoas, lugares e situações — daí que esta seja uma viagem eminentemente pessoal, com a actriz/realizadora a conduzir-nos através de um sugestivo contraponto com as suas próprias memórias de infância, ligadas às convulsões da Segunda Guerra Mundial.
"Sea Sorrow", o título do filme, provém do texto de "A Tempestade", de William Shakespeare, sinalizando uma "tristeza" ou um "lamento" que no mar encontra o seu perturbante retrato e simbologia. Daí a presença de Emma Thompson e Ralph Fiennes, lendo, precisamente, palavras de Shakespeare — trata-se, afinal, de lembrar que a abordagem das tragédias do presente, para além do fundamental trabalho político, podem também ser encaradas a partir dos valores perenes herdados da palavra escrita.