Judi Dench e Ali Fazal — dois actores em estado de graça


joao lopes
30 Set 2017 16:32

Cinema histórico?… Convenhamos que a expressão sofre, hoje em dia, de uma cega desvalorização. A proliferação de heróis digitais, alheios a qualquer contexto histórico, introduziu no espaço social do cinema uma noção de arbitrariedade (histórica, precisamente) que tem vindo a formatar os olhares de muitos espectadores, em particular os mais jovens que raramente são expostos a qualquer alternativa menos retórica.

Por isso (e não só…), vale a pena saudar com especial entusiasmo a proposta que o inglês Stephen Frears formula no novo "Vitória e Abdul". A evocação da singular relação da Rainha Vitória com o seu criador indiano Abdul Karim está muito longe de se reduzir a uma colecção de cenários e guarda-roupa de "reconstituição" — Frears revisita o Império Britânico em finais do século XIX para, afinal, nos proporcionar uma tocante viagem afectiva e psicológica.
A integração de Abdul como criado de Vitória resulta de um banal episódio protocolar, mas vai evoluir de modo insólito. Na verdade, quando a rainha começa a desvendar os muitos conhecimentos de Abdul e, mais do que isso, a sua delicada sensibilidade, a diferença que os separa será também, paradoxalmente, um factor de aproximação — em última instância, Vitória reconhece nele um professor e não é das menores maravilhas do filme que tudo isso nos seja apresentado num sábio equilíbrio de dramatismo e contagiante humor.
Como sempre, Frears revela-se um impecácel director de actores. O destaque vai, como seria inevitável, para Judi Dench, admirável na composição de uma rainha que pode atrair a caricatura, mas que se revela muito para além de qualquer maniqueísmo (recordemos que o cineasta a dirigira em 2013, no também magnífico "Filomena"). Grande vedeta de Bollywood, Ali Fazal surge impecável na personagem de Abdul, mas é em torno de Judi Dench que fica uma expectativa. A saber: mais uma nomeação para o Oscar… ou mesmo um pouco mais do que isso…

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