18 Ago 2018 0:47
Quem se lembra de "Assim Nasce uma Estrela" (1954), de George Cukor, com Judy Garland e James Mason? Para além da sua excelência, digamos, para simplificar, que se trata de uma matriz de um "género" que tem pontuado a história do cinema. A saber: a encenação das convulsões afectivas e profissionais de uma mulher que se transforma numa star. Aliás, é sabido que há um novo "Assim Nasce uma Estrela", interpretado por Lady Gaga e Bradley Cooper (também realizador), que chegará na próxima temporada às salas de cinema.
Ao realizar "Maryline", o francês Guillaume Gallienne poderá ter pensado (ou não) nessa referência inspiradora. O certo é que o seu filme relança uma das suas componentes vitais. Assim, deparamos com uma jovem, Maryline, precisamente, que abandona o seu meio rural para tentar consolidar o sonho de ser actriz — o filme é, afinal, o relato desse sonho atribulado, por vezes tocado pelos sinais de um pesadelo.
A cena de arranque do filme, centrada no problema de escolher um destino para as cinzas do pai de Maryline, desenvolve-se num tom irónico que faz pressentir a instalação de algum burlesco — o primeiro filme de Guillaume, "A Mamã, os Rapazes e Eu!" (2013), neste caso com actor/realizador, uma insólita comédia intimista, faria pensar em tal orientação. O certo é que, a pouco e pouco, os dramas de Maryline — em particular a sua dificuldade de, realmente, ser actriz — vão adquirindo qualquer coisa de dantesco.
É pena que o filme, por hesitação ou pudor, vá hesitando entre construir uma imagem "doce" das atribulações de Maryline e expor de forma directa as angústias da sua experiência. Seja como for, na sua dispersão, "Maryline" contém duas ou três sequências de surpreendente vibração emocional. Principal responsável: Adeline D’Hermy, actriz decididamente inclassificável que consegue emprestar à sua personagem as tensões próprias de quem vive o seu desejo entre a utopia e a tragédia.