joao lopes
27 Jan 2019 22:44
Nascido na cidade alemã de Hilden, em 1960, Christian Petzold tem-se distinguido pela capacidade de lidar com momentos críticos da história da Alemanha — lembremos os casos exemplares de títulos como "Barbara" (2012) ou "Phoenix" (2014). Assim volta a acontecer com "Em Trânsito", com um twist francamente perturbante.
O filme tem como base o romance "Transit", de Anna Seghers, publicado em 1942 — nele se faz o retrato da França ocupada pelos nazis a partir da narrativa de um sobrevivente dos campos de concentração. A narrativa segue a sua fuga para o Sul do país, para a região de Marselha, embora, agora, de forma assumidamente ambígua.
Porquê? Porque Petzold propõe uma insólita transfiguração: a acção surge situada em cenários do nosso século XXI… Daí a pergunta compulsiva: estamos perante um objecto de ficção científica? Não, claramente não: "Em Trânsito" apresenta-se mesmo como um lugar de coexistência & contaminação entre as memórias do passado e os sinais do presente.
Escusado será sublinhar que assim se estabelece um curto-circuito dramático entre refugiados dos dois tempos, mesmo se Petzold recusa estabelecer qualquer tipo de "equivalência" entre um tempo e outro — em vez de ter encenado uma acção concreta que se salda numa abstracção, "Em Trânsito" é um exercício abstracto que, pedagogicamente, nos devolve ao nosso aqui e agora.