joao lopes
14 Out 2019 3:50
O património filmográfico de Agnès Varda (1928-2019) é, de facto, impressionante. Nele encontramos notáveis ficções como "Duas Horas na Vida de uma Mulher" (1962) ou "Sem Eira nem Beira" (1985), a par de insólitos e sedutores exercícios documentais como "Olhares Lugares" (2017), co-assinado com o fotógrafo JR.
Reencontrá-la, agora, com o seu filme final — "Varda por Agnès" (2019) — envolve, por isso, qualquer coisa de didáctico. Mais do que um documentário auto-biográfico, Varda quis partilhar com o espectador uma espécie de pessoalíssimo bloco-notas elaborado a partir de diversas conversas/conferências.
Em boa verdade, somos levados a considerar que, em qualquer registo, o labor de Varda teve sempre qualquer coisa de ambivalente, a ponto de o gosto de contar histórias e a procura de sentidos para a sua própria história se cruzarem e, mutuamente, se iluminarem. Nesta perspectiva, "Varda por Agnès" funciona como complemento narrativo e simbólico de "As Praias de Agnès" (2008).
Tal como o seu marido, Jacques Demy (1931-1990), ela foi, afinal, uma criadora profundamente ligada ao espírito inovador da Nova Vaga francesa, acabando por construir uma obra que, ao longo de mais de meio século, se empenhou em lidar com todas as formas do humano — ""Varda por Agnès" é também uma crónica sobre a arte de ser espectador(a) do mundo.