14 Nov 2019 18:34
Por vezes, há projectos cuja energia nasce do seu carácter obstinado, para não dizer obsessivo. "Os Órfãos de Brooklyn" é um desses projectos, sustentado por Edward Norton ao longo de duas décadas. Foi em 1999 que Norton se interessou pelo romance de Jonathan Lethem, fascinado que ficou pela personagem central, um homem que sofre de síndrome de Tourette, trabalhando numa pequena agência de detectives. O certo é que, apesar de várias tentativas, a adaptação nunca encontrou um realizador… até que Norton, ele próprio, decidiu avançar assumindo a tripla função de intérprete, argumentista e realizador.
Tratava-se, afinal, de encontrar o tom certo para fazer o retrato de Lionel Essrog, com todos os seus tiques, palavras e frases ditas sem controle, ao mesmo tempo não alienando a ambiência policial que a história requeria. Recuando a acção para os anos 50, Norton oferece-nos um complexo e fascinante Lionel, conseguindo também contar a sua história à maneira do clássico "film noir", num registo em que, naturalmente, a fundamental voz off é assumida por ele próprio.
Haverá em "Os Órfãos de Brooklyn" alguns momentos em que a dinâmica narrativa parece um pouco precipitada, como se se quebrasse o equilíbrio entre a acção física e os seus ecos na exposição de Lionel. Em qualquer caso, isso não impede que o filme seja um objecto francamente original, afinal quase solitário, na actual produção americana.
Estamos perante o misto de tragédia e ironia de uma história de solidão (infelizmente, uma vez mais, este é um título português infiel ao original: a opção correcta seria o singular, "órfão"). O seu impacto emocional é tanto mais forte quanto a acção envolve um leque de personagens profundamente contrastadas, aliás sustentadas por um elenco de luxo em que, além de Norton, encontramos Gugu Mbatha-Raw, Willem Dafoe, Alec Baldwin e Bruce Willis. Pela brevidade, e também pela intensidade, da sua presença, Willis é mesmo uma "guest star" à moda antiga.