17 Nov 2019 0:35
A política de combate à droga nas Filipinas, implementada pelo Presidente Rodrigo Duterte, tem sido marcada por muitas mortes, quer de traficantes, quer de toxicodependentes. De tal modo que a comunidade internacional tem apelado à moderação das autoridades filipinas, nomeadamente através do Conselho para os Direitos Humanos das Nações Unidas — semelhante posição ficou mesmo registada, a 19 de Junho de 2018, numa declaração de 38 países (incluindo França, Alemanha, Portugal, Reino Unido e EUA).
O novo e perturbante filme de Brillante Mendoza, "Alpha: Nos Bastidores da Corrupção", é sobre essa conjuntura, ainda que num registo de distanciamento, evitando qualquer generalização fácil (há mesmo uma legenda final que esclarece que "qualquer semelhança com pessoas verídicas é pura coincidência"). Trata-se, afinal, de encenar um drama ambíguo: por um lado, através da acção, realmente brutal e implacável, dos elementos policiais; por outro lado, usando como pivot narrativo um polícia, o oficial Espino (interpretado pelo excelente Allen Dizon), que tira dividendos pessoais das apreensões de droga que a sua unidade efectua.
Mendoza, convém recordar, é um intransigente realista. Antes de (ou melhor: em vez de) começar por impor qualquer matriz moral de definição das suas personagens, o seu olhar interessa-se pelas convulsões de uma situação em que a violência física é "apenas" o sinal mais óbvio de toda uma complexa e desequilibrada textura social. Nesta perspectiva, é especialmente importante a personagem de Elijah (Elijah Filamor), informador de Espino, peça reveladora da circulação do dinheiro: o seu negócio "paralelo" cruza-se com as suas compras de alimentos para o filho…
"Alpha: Nos Bstidores da Corrupção" corresponde a um novo e fundamental capítulo na trajectória de Mendoza enquanto observador crítico das tragédias internas do seu país. Antes, em "Mãe Rosa" (2016), filmara a saga de uma família que tenta compensar o seu magro orçamento envolvendo-se no sistema de circulação das drogas (o filme valeu, aliás, a Jaclyn Jose o prémio de interpretação feminina em Cannes) — o realismo é, aqui, de uma só vez, um método de trabalho e uma pedagogia do olhar.