joao lopes
23 Out 2020 23:12
Não há muitos filmes como "O Capital no Século XXI". Porquê? Antes do mais, porque nele se formula uma pergunta que, embora retomando temas correntes do nosso espaço mediático, os reconverte em qualquer coisa de inesperado e perturbante. Dito de outro: não se trata de questionar o modo como o dinheiro é investido, mas sim de perguntar onde está o dinheiro.
Com realização de Justin Pemberton, trata-se de fazer eco do livro homónimo do professor de economia, investigador e historiador Thomas Piketty, publicado em 2013. Livro de grande impacto, gerador de inúmeros debates e polémicas, nele encontramos uma dupla constatação: o sistema comunista afundou-se nas suas contradições; o capitalismo não garante uma distribuição equilibra da riqueza que as nações produzem.
Piketty surge no próprio filme como um dos entrevistados. Mais do que isso: o seu nome está associado à respectiva concepção narrativa. Certamente por isso, há em "O Capital no Século XXI" a ambição de evocar cerca de três séculos da história da humanidade, das convulsões dos tempos da Revolução Francesa até este tempo digital em que a palavra "globalização" pode ter tanto de sonho como de pesadelo.
Por uma vez, importa sublinhar as qualidades genuinamente pedagógicas de um filme deste teor. Mais, muito mais, do que a mera exposição de uma tese, estamos perante um exercício de pensamento & argumentação, de inventariação de dúvidas e formulação de hipóteses em que tudo se cruza — a história colectiva integra também uma dramaturgia individual. Vale a pena pensar com Piketty, seja qual for o grau de concordância que os seus enunciados nos possam suscitar.