joao lopes
26 Set 2021 23:40
A lógica moralizante (por vezes, apenas moralista) de muitas matrizes contemporâneas de informação e jornalismo gerou uma nova tipologia cinematográfica. Em boa verdade, trata-se de uma derivação de algumas formas televisivas de ficção que se definem (e tentam impor-se) através da reconhecida e indesmentível importância dos "temas" que abordam — é um cinema que, incapaz de lidar com a realidade que visa "denunciar", se limita a coleccionar sintomas.
"Nova Ordem", do cineasta mexicano Michel Franco, é mais um exemplo disso mesmo. A sua encenação de uma conjuntura brutal — uma luxuosa festa de casamento interrompida pelo assalto de um grupo de marginalizados pela sociedade — pressupõe (ou solicita) a aceitação de um maniqueísmo sem alternativa: de um lado está a corrupção da "riqueza", do outro a justiça da "pobreza"…
Em boa verdade, nem um grupo nem outro é tratado com um mínimo de pertinência descritiva. Trata-se apenas de "empurrar" o espectador para um dicotomia que, por solidariedade humanista, o leve a escolher o lado bom daquele frente a frente. Sem esquecer que, a partir de certa altura, a entrada em cena do exército permite suscitar os paralelismos que cada um entender com os ecos difusos de uma situação concreta (mexicana, neste caso).
Não se trata de questionar a boa fé de Michel Franco. Como não se trata de pôr em causa a defesa dos que qualquer sociedade empurrou para uma vida de miséria. Acontece que um filme é um filme é um filme, não uma mera acumulação de sugestões ideológicas que possa sustentar um qualquer discurso "panfletário"… Ou apenas para alimentar a boa consciência do espectador.
Infelizmente, "Nova Ordem" limita-se a coleccionar clichés dramáticos, eventualmente, na melhor das hipóteses, suscitando o desejo de conhecer melhor a realidade concreta do México dos nossos dias. Pelo caminho, o cinema vai sendo reduzido a uma acumulação de "gadgets" incapazes de pensar o que significa pensar a política, a sua ordem, eventualmente também a sua desordem.