13 Abr 2023 12:04

"A Flor do Buriti", o novo filme de João Salaviza e Renée Nader Messora terá estreia mundial na secção Un Certain Regard do Festival de Cannes. Continuando com os Krahô, depois de "Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos", o filme mostra a luta pela terra e as diferentes formas de resistência implementadas pela comunidade da aldeia Pedra Branca, situada na região Tocantins no Brasil.

Repartido por três momentos, "A Flor do Buriti" atravessa os últimos 80 anos dos Krahô. Regressa a 1940, a altura de um massacre perpetrado por dois fazendeiros da região e prossegue em 1969, durante a ditadura militar, época em que o estado brasileiro incita muitos dos sobreviventes a integrarem uma unidade militar. Hoje, diante de velhas e novas ameaças, os Krahô seguem o caminho sobre a sua terra sangrada, reinventando infinitas formas de resistência.

“O filme nasce do desejo em pensar a relação dos Krahô com a terra, pensar em como essa relação vai sendo elaborada pela comunidade através dos tempos. As diferentes violências sofridas pelos Krahô nos últimos 100 anos também alavancaram um movimento de cuidado e reivindicação da terra como bem maior, condição primeira para que a comunidade possa viver dignamente e no exercício pleno de sua cultura”, explica a realizadora Renée Nader Messora.

“Nós não trabalhamos com um argumento fechado. A questão da terra é a espinha dorsal do filme. Propusemos aos "atores" trabalhar a partir desse eixo, criar um filme que pudesse viajar pelos tempos, pela memória, pelos mitos, mas, que, ao mesmo tempo fosse uma construção em aberto realizada enquanto fossemos filmando. A narrativa foi sendo construída com a Patpro, o Hyjnõ e o Ihjãc, que assinam igualmente o argumento”, explica o realizador, João Salaviza.

A violência do passado continua a ecoar nas novas gerações, algo que colocou dúvidas na mente dos cineastas.

"Filmar o massacre era um grande dilema. Se por um lado é uma história que deve ser contada, por outro não nos interessava produzir imagens que perpetuassem novamente uma violência. Percebemos que a única forma de filmar essa sequência era a partir da memória compartilhada, a partir de relatos, do que ainda perdura no imaginário coletivo de um povo que insiste em sobreviver”, comenta Renée.

"A Flor do Buriti" foi filmado durante quinze meses, em película 16mm, dentro da Terra Indígena Kraholândia. Tal como em "Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos", foi usada uma equipa muito reduzida, dividida entre indígenas e não indígenas. Relatos históricos baseados em conversas e a realidade atual da comunidade serviram de base para a construção da narrativa.

“A importância dos povos originários não reside apenas no conhecimento ancestral, mas também na elaboração de tecnologias totalmente sofisticadas de defesa da terra. Os Krahô estão radicalmente na contemporaneidade. O Festival também será importante como lugar para se formar novas alianças, e usar a sua capacidade de sedução cultural para que possam ser reativadas no futuro. De facto, o bolsonarismo foi um verdadeiro massacre, tanto na destruição dos povos e os seus direitos, como da terra. Agora, o que acontece é uma contra-ofensiva muito mais bela e forte que também tentamos filmar. O mundo está atento aos Krahô. É muito bom para nós, cineastas e aliados, ver o lugar que o filme pode ocupar.”, ressalta João Salaviza sobre a importância de integrar a Seleção Oficial de Cannes.

O filme será exibido pela primeira vez no Festival de Cannes, entre 16 e 27 de maio. Em 2018, a dupla João Salaviza e Renée Nader Messora, recebeu o Prémio Especial do Júri com "Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos", sendo até hoje o único filme português premiado na secção Un Certain Regard.

  • CINEMAX - RTP
  • 13 Abr 2023 12:04

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