17 Mai 2016 18:04
Que podemos esperar de um cineasta consagrado, reaparecendo no maior festival de cinema do mundo? Muitas coisas, por certo, não sendo a mais interessante a mera "cópia" dos sinais que o ajudaram a criar uma determinada imagem de marca.
Infelizmente, parece ser essa a atitude dominante no trabalho do espanhol Pedro Almodóvar no seu novo "Julieta", presente na secção competitiva de Cannes. O ponto de partida são três contos da "nobelizada" Alice Munro: para contar a história de uma mulher que tenta reencontrar a filha (com quem deixou de ter contactos há mais de uma década), Almodóvar repete as suas cores quentes e diálogos introspectivos, mas quase só o sentimos a tentar imitar os seus melhores momentos.
Seja como for, refira-se que o filme parte de uma curiosa solução de encenação, através da representação de Julieta através de duas actrizes, Emma Suárez e Adriana Ugarte, respectivamente para as cenas do presente e as evocações do passado. Lembramo-nos da solução de Luis Buñuel em "Este Obscuro Objecto do Desejo" (1977), com a mesma Conchita a ser interpretada, sucessivamente, por Carole Bouquet e Angelina Molina — mas o que, em Buñuel, se impunha como um dispositivo fantasmático, funciona em "Julieta" como um gadget linear.
Será este um fantasma de outro tipo? A saber: a tentativa de (re)afirmação de um cineasta através da evocação do seu próprio património. É bem certo que, depois do burlesco de "Os Amantes Passageiros", Almodóvar tenta reencontrar as suas mais genuínas raízes melodramáticas — mas persiste a sensação de uma cópia sem imaginação e, estranhamente, sem motivação.