25 Mai 2019 1:17
Digamos o mais simples: o francês Arnaud Desplechin é um cineasta dos corpos, das suas diferenças e energias, dos seus conflitos e cumplicidades. A meu ver, é mesmo essa dimensão que confere especial intensidade a crónicas sociais como "Reis e Rainha" (2004) ou "Um Conto de Natal" (2008).
Com o seu novo filme na competição de Cannes, "Roubaix, une Lumière", Desplechin prolonga as componentes do seu universo, desta vez derivando para um registo mais próximo de uma certa tradição policial da produção francesa. Tudo se passa em Roubaix, cidade natal do realizador, em torno das investigações do comissário Daoud (Roschdy Zem) e, em particular, das suspeitas de um crime que recaem sobre Marie (Sara Forestier) e Claude (Léa Seydoux).
Por um lado, as interpretações, em especial das duas actrizes principais, possuem essa dimensão visceral que Desplechin gosta de despertar naqueles que coloca em frente à câmara. Por outro lado, "Roubaix, une Lumière" é um filme organizado como uma teia de eventos díspares, facto que nem sempre favorece a sua consistência dramática.
Seja como for, sublinhe-se o tour de force: a parte (mais longa do filme) em que Marie e Claude são interrogadas funciona como uma deambulação sobre a verdade e, mais do que isso, a produção da verdade. Resta saber se o universo de Desplechin se vai manter fiel à complexidade das suas personagens, ou se corre o risco de se fixar em exercícios de estilo.