20 Mai 2023 22:41
Filmado em segredo em Karachi e apresentado na secção paralela da Quinzena dos Cineastas, em Cannes, o filme de terror “In Flames” denuncia as ameaças aos direitos das mulheres no Paquistão e, de uma forma mais geral, em todo o mundo.
O projecto foi inspirado nos testemunhos de mulheres que vivem no Paquistão: “Quando me falavam da sua vida quotidiana, parecia um filme de terror. Era impossível imaginar como é uma pessoa capaz de viver assim todos os dias, com a religião a ser utilizada como um instrumento do patriarcado”, disse à AFP o realizador Zarrar Kahn.
“Pareceu-me óbvio que tínhamos de fazer um filme sobre este tema, sobretudo quando vemos o que está a acontecer no Irão, o que está a acontecer nos Estados Unidos em relação ao direito ao aborto. São tempos difíceis para os direitos das mulheres em todo o mundo”, insiste.
Esta primeira longa-metragem, apresentada na Quinzaine des Cinéastes, segue Mariam (Ramesha Nawal), uma jovem mulher assombrada por visões, e a sua mãe, pouco depois da morte do patriarca da família. Ao mesmo tempo, reaparece um tio que se oferece para as ajudar financeiramente.
Uma das mensagens transmitidas pelo filme é que o perigo está em todo o lado: de manhã, a caminho da escola e em casa. E embora nem todos os homens que conhecemos representem uma ameaça, como o namorado de Mariam, nenhum deles quebra realmente os códigos esperados da sociedade paquistanesa.
“Apesar de ser simpático, Mariam sente-se como um salvador e insiste em sê-lo, apesar de ela não precisar de ninguém. Ela consegue afirmar-se por si própria, fazendo as suas próprias escolhas”, diz Kahn.
Embora o género de terror seja popular no Paquistão, os temas do filme obrigaram a equipa a tomar precauções durante a rodagem.
” Tivemos algumas dificuldades”, admite o realizador antes de ser corrigido pela actriz com um sorriso: “Algumas?
Na verdade, “filmámos muitas cenas em segredo, porque sabíamos que a natureza do filme era sensível. Isso permitiu-nos fazer o filme que queríamos, sem concessões. A minha equipa e eu filmamos em Karachi há 10 anos, por isso sabíamos onde filmar e com quem falar”, diz Kahn.
Outra dificuldade foi a deserção da actriz prevista para o papel principal alguns dias antes das primeiras filmagens, o que obrigou a encontrar uma alternativa à última hora.
“A primeira ocasião em que nos encontrámos com Ramesha foi através do Zoom, duas semanas antes da rodagem do filme. Falámos durante 45 minutos, porque só tínhamos a versão gratuita da aplicação e a ligação foi cortada”, recorda o realizador.
O Paquistão esteve representado pela primeira vez na selecção oficial de Cannes no ano passado com “Joyland”, que ganhou o prémio alternativo para filmes LGBTQI+, o Queer Palm.