13 Mai 2018 1:10
Tempos difíceis, estes em que, através de muitos discursos e tomadas de posição, a discussão das grandes clivagens do nosso mundo — desde as convulsões humanas motivadas pelas guerras até à reafirmação das identidades femininas — envolve uma gigantesca exposição mediática. Há de tudo nessa exposição, desde a discussão grave, séria e fundamentada, até à exploração gratuita ou demagógica.
Daí a dificuldade em definir de modo conciso, resistindo a qualquer maniqueísmo, a proposta de um filme como "Les Filles du Soleil" [fragmento]. Por um lado, é verdade que nele se tenta compor um hino ao desejo de liberdade e autonomia do povo kurdo, simbolizado pelo combate de um batalhão de mulheres; por outro lado, como é possível que se trate assunto tão complexo e, sobretudo, tão delicado através de matrizes dramáticas tão simplistas?
Escrito e dirigido pela francesa Eva Husson, o filme tenta definir a amplitude dos seus temas através do diálogo de duas mulheres: Bahar (Golshifteh Farahani), comandante do batalhão ‘Les Filles du Soleil’ (à letra: ‘as filhas do sol’), e Mathilde (Emmanuelle Bercot), uma jornalista francesa que acompanha as lutas da causa kurda. E de tal modo o faz que, a certa altura, dir-se-ia que há apenas uma acção física regularmente "interrompida" por patéticos diálogos entre as duas mulheres, conversando como se fossem protagonistas de um banal diálogo televisivo viciado em generalizações geo-políticas…
O resultado tem qualquer coisa de sermão de boas intenções. Como se isso não bastasse, para agravar a situação, o filme aposta num registo de "thriller" de guerra recheado de clichés visuais e sonoros… Anunciado como um dos grandes acontecimentos "temáticos" de Cannes/2018, "Les Filles du Soleil" é apenas um momento de cinema simplista, incapaz de lidar com a densidade dos temas que convoca.