15 Ago 2024
A loira radiosa Gena Rowlands, figura do cinema independente americano, morreu quarta-feira aos 94 anos. Destacou-se em perto de sessenta papéis ecléticos sob a direção do seu marido John Cassavetes, e também em obras de Woody Allen e Jim Jarmusch.
Gena Rowlands, que, de acordo com o filho, Nick Cassavetes, sofria da doença de Alzheimer há cinco anos, morreu na sua casa em Indian Wells, Califórnia.
Descreveu o marido como tendo escrito para ela “os papéis mais bonitos com que uma atriz poderia sonhar”, desde a call girl em “Rostos” (1968) a uma dona de casa à beira da loucura em “Uma Mulher Sob Influência” (1974).
Trabalhar com o homem que se recusava a aceitar os ditames dos grandes estúdios de Hollywood era “entusiasmante, porque a responsabilidade do papel recaía toda sobre os nossos ombros”, afirmou a atriz.
O cinema devorou os seus 35 anos de casamento, filmando muitas vezes em casa para poupar dinheiro – com os fiéis Peter Falk, Ben Gazzara e Seymour Cassel – e com Gena a fazer spaghetti para todos, entre nuvens de fumo e vapores de whisky.
Os três filhos não escaparam a este sorvedouro cinematográfico: Nick, Xan (Alexandra) e Zoe são todos atores e realizadores.
John Cassavetes aproveitou ao máximo os talentos da sua musa, uma beleza perturbadora de voz rouca, não hesitando em utilizar elementos da sua vida privada.
Gena, por seu lado, sempre se identificou com as suas personagens: “Todos temos um pouco de cada um dentro de nós. Atuar é simplesmente abrir uma porta”.
Só uma vez recusou um papel a Cassavetes: o de Mabel em “Uma Mulher Sob Influência”, originalmente destinado ao teatro, que considerou “demasiado intenso emocionalmente para ser interpretado todas as noites”. Ele reescreveu-o para o cinema, e Mabel valeu-lhe um Globo de Ouro para Melhor Atriz (1975).
Não a Hollywood
Nascida a 19 de junho de 1930 em Cambria (Wisconsin), filha de um pai banqueiro e senador e de uma mãe pintora, a infância de Virginia Cathryn Rowlands predispunha-a para uma vida mais convencional.
Contudo, aos 20 anos, a fã de Bette Davis interrompeu os estudos na Universidade de Wisconsin para frequentar aulas de teatro em Nova Iorque. Aí começou a sua “vida real” no palco (“Seven Years of Thinking” de George Axelrod). Pouco depois, conheceu um jovem e belo ator, John Cassavetes, com quem casaria em 1954, quatro meses após o conhecer.
Nascido em Nova Iorque e com origem grega, Cassavetes ficou cativado por esta loira elétrica que, tal como ele, se “alimentava” de filmes franceses e italianos.
No entanto, o teatro continuou a ser a paixão de Gena e, dois anos mais tarde, foi revelada em “In the middle of the night” de Paddy Chayefsky, contracenando com Edward G. Robinson durante 18 meses.
Em 1958, depois de séries televisivas que financiaram a carreira de John, que se tornara cineasta, Gena deu nas vistas no grande ecrã em “L’Amour coûte cher”, de José Ferrer, e “Seuls sont les indomptés”, de David Miller, com Kirk Douglas.
Recusou Hollywood e regressou a Nova Iorque: “Segui sempre o que o meu coração mandava e não me arrependo”.
Cassavetes, que “tocava em assuntos em que as mulheres pensam, mas que não se esperam de um homem”, disse à AFP, deu-lhe papéis fortes em sete filmes, incluindo “Noite de Estreia” (Urso de Prata para Melhor Atriz no Festival de Berlim de 1978), “Glória” (1980) e “Love Streams – Amantes” com Ben Gazzara (Urso de Ouro no Festival de Berlim de 1984).
Quando John Cassavetes morreu de cirrose hepática aos 59 anos, em 1989, Gena, que acabara de filmar “Another Woman” de Woody Allen, continuou a ser muito solicitada para o grande ecrã e para séries de televisão.
Também atuou para Nick Cassavetes, o seu filho. Depois de “Décroche les étoiles” (1996) com Gérard Depardieu, “N’oublie jamais” (2004) valeu-lhe o Golden Satellite Award 2005 para Melhor Atriz Secundária.
Gena também aceitou o papel de mãe no primeiro filme da sua filha Zoe, “Broken English” (2007), e foi uma das três heroínas de “Parts per billion” (2013), de Brian Horiuchi.
Casada de novo com o empresário Robert Forrest em 2012, recebeu um Óscar de mérito especial em 2015, ano em que se retirou.