09 Set 2024
O MOTELX – Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa cumpre este ano a 18.ª edição e a organização faz “um balanço muito positivo” do percurso do certame, “nem que seja pelo facto de 18 edições depois ainda existir”, referiu um dos diretores, João Monteiro, em declarações à Lusa.
“Tem obviamente corrido bastante bem a nível de público, mas acho que não só isso. Conseguimos, de certa maneira, com o espaço que damos ao cinema de género nacional — quando nós começámos era assim uma espécie de conceito abstrato — estimular a produção de filmes, por intermédio das curtas-metragens, mas também de algumas secções, nomeadamente a Quarto Perdido, que tenta estabelecer uma raiz para o cinema de terror nacional, ou cinema de género”, disse João Monteiro.
Foi na 3.ª edição, quando iniciaram a secção Quarto Perdido e começaram a atribuir o prémio para Melhor Curta Portuguesa que sentiram “que as coisas mudaram bastante”, recordou Pedro Souto, o outro diretor do festival.
“Nos dois primeiros anos do festival tivemos algumas ‘curtas’, que fomos recebendo ou descobrindo, mas muito, muito poucas. E de repente são dezenas e dezenas todos os anos. Já ultrapassámos à vontade as mil ‘curtas’ recebidas, exibidas não foram tantas porque há sempre o processo de seleção”, disse.
João Monteiro fala na “felicidade enorme” que é chegar às 18 edições e “ter todos os anos a estreia de uma longa portuguesa no MOTELX”.
“E já não são sequer coisas que temos que defender arduamente como sendo de género, são coisas que se assumem como género. Foi o caso do Gabriel Abrantes no ano passado (com ‘A semente do mal’) e é o caso do Edgar Pera este ano (com ‘Cartas telepáticas’)”, partilhou.
Apesar disso, João Monteiro e Pedro Souto consideram que ainda há trabalho a fazer no cinema de terror em Portugal.
“A questão do preconceito ainda é uma coisa que afeta (o cinema de terror). Uma das coisas mais importantes é começar a usar o filme de terror (em Portugal) como é usado em muitos países, que é para fazer uma espécie de catarse nacional”, defendeu João Monteiro.
Lembrando que “Portugal tem uma história gigantesca, tem coisas incríveis”, o diretor do festival considera haver “muita coisa que se pode explorar”, e “através da exploração de alguns tópicos falar sobre o presente”.
“Já não há muitos filmes sobre a questão do Estado Novo e da Guerra Colonial, mas se andarmos para trás temos três séculos de Inquisição, temos ocupação árabe, ocupação romana”, referiu.
Para João Monteiro, embora existam já “muitos estetas, pessoas que têm noção do que é um filme de terror – como é que se constrói, o tipo de imagens -, ainda falta um bocadinho o conteúdo”.
Nesse âmbito, os diretores recordaram a parceria estabelecida com o Guiões — Festival de Roteiro de Língua Portuguesa, cuja 10.ª edição acontece inserida na programação do MOTELX.
“Havia uma lacuna, pessoas que só escrevessem sobre terror, e aí é um caminho que pode ser explorado e dar esse passo em frente, que é talvez o que falta fazer”, referiu João Monteiro.
A programação do 18.º MOTELX conta com uma dose reforçada de curtas-metragens portuguesas, filmes banidos pelo Estado Novo e “uma série de filmes muito esperados pelos fãs do género, mas também de todos os cinéfilos”.
Pedro Souto destaca “MaXXXine”, de Ti West, que marca o fim da trilogia “X”, e a segunda longa-metragem de Tilman Singer, “Cuckoo”, que conta com Hunter Schafer da série “Euphoria” no papel principal.
“Inclui-se também neste leque dos mais esperados, dos mais talvez até intensos e assustadores, ‘Oddity’ de Damian Mc Carthy, ‘In a violent nature’, de Chris Nash, e ‘The Substance’, de Coralie Fargeat, que traz Demi Moore num dos grandes papéis da sua carreira”, num filme que venceu o prémio de melhor argumento em Cannes.
Este ano, oito filmes disputam o Prémio Méliès de Melhor Curta Europeia e há dez filmes a competirem pelo Prémio MOTELX – Melhor Curta de Terror Portuguesa 2024.
Na secção Quarto Perdido, o festival apresenta “A Culpa” (1980), um filme do maestro e compositor António Victorino D’Almeida e que é “um dos primeiros exemplos de ficção, depois do 25 de Abril, sobre a guerra colonial”.
Destaca-se ainda uma nova secção, a Sala de Culto, para “obras inqualificáveis da sétima arte”, com o festival a resgatar o telefilme “Experiência em Terror” (1987), de Andrade Albuquerque, e a exibir “O velho e a espada” (2024), de Fábio Powers, rodado na Beira Baixa.
O 18.º deste ano também está alinhado com as comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos, pelo que exibirá o ciclo “A Bem da Nação – Filmes de Terror Proibidos pelo Estado Novo”, com quatro obras censuradas.
Segundo o festival, entre 1944 e 1974 estrearam-se apenas 23 filmes de terror nos cinemas portugueses, 16 foram totalmente proibidos e apenas um se estreou sem cortes.