19 Mai 2018 2:47
Embora seja politicamente pouco correcto reconhecer que há em algum cinema queer uma retórica visual de crescente academismo, filmes como "Un Couteau dans le Coeur" (apresentado na competição de Cannes) reflectem um verdadeiro impasse de linguagem. Mesmo quando podemos reconhecer a agilidade da sua realização.
O cineasta Yann Gonzalez tenta, de alguma maneira, sustentar o maneirismo do seu filme através de uma intriga que espelha os mecanismos do próprio cinema: tudo se passa em Paris, em 1979, tendo como centro Anne, uma produtora de pornografia gay — a própria utilização de imagens de filmes de 16 mm é significativa desse misto de formalismo e nostalgia que acaba por condicionar todos os elementos do filme.
Um dos efeitos mais drásticos de tais características de linguagem é a esquematização do trabalho dos actores, quase só solicitados para trabalho de pose e "desfile". A excepção é Vanessa Paradis, no papel de Anne, sempre inconsistente na representação das convulsões dramáticas da sua personagem.
Dir-se-ia que estamos perante um universo a meio caminho entre o romantismo e o videoclip. A escassez de soluções que ultrapassem um banal "decorativismo" é tanto mais evidente quanto "Un Couteau dans le Coeur" tenta integrar elementos mais ou menos típicos de algum cinema de terror — as referências são sugestivas, o academismo prevalece.