8 Mai 2015 23:12
Que balanço podemos fazer de "Visita ou Memórias e Confissões" (1982), de Manoel de Oliveira?
A pergunta, por insólita ironia, desfaz-se perante o próprio objecto que encara. De facto, a noção de "balanço" poderia fazer supor que o filme póstumo de Oliveira nos remete apenas para um determinado passado. Ora, acontece que a sua descoberta mais de trinta anos depois da sua rodagem nos devolve ao poder mais radical do cinema. A saber: a sua condição de eterno presente.
Assim, contemplamos Oliveira não apenas como alguém que, aos 73 anos, nos fala das atribulações da sua vida familiar e profissional, mas também como um visitante do nosso ecrã, desafiando-nos para a grande aventura do cinematógrafo como reinvenção constante da vida, mesmo para além da morte.
Será preciso relembrar que nada disto se faz sem a integração de uma maravilhosa ironia? Afinal de contas, "Visita ou Memórias e Confissões" renasce dos cofres da Cinemateca para nos fazer ver/sentir o cinema como esse instrumento despojado em que a vida se faz eternidade, brincando com o irreversível do tempo.
Será também uma maneira de, colectivamente, começarmos a superar a estupidez herdada dos lugares-comuns que, ao longo de décadas, quiseram reduzir o trabalho de Oliveira a alguns estafados estereótipos (sobre a duração dos planos, a minutagem dos filmes, etc.). O que vemos neste filme é tão só um homem a inscrever na matéria fílmica a sua própria verdade existencial — e isso, no risco que implica, é sempre tocante.